Arenápolis News - arenapolisnews.com.br
Cultura
Sábado - 02 de Novembro de 2013 às 13:41

    Imprimir


 Quem acompanha a carreira dos Titãs sabe que a banda sempre procurou explorar temas em sintonia com os acontecimentos e traduzir em canções momentos importantes da história recente do país. Não é à toa que músicas como “Polícia” e “Desordem”, escritas há quase três décadas, continuam atuais e recentemente fizeram parte da trilha sonora das manifestações que se espalharam pelo país.
 
Mais de 30 anos depois do início do grupo, Branco Mello, Paulo Miklos, Sérgio Britto e Tony Bellotto continuam com as antenas ligadas. Os músicos estão na estrada promovendo o show “Titãs Inédito”, mostrando uma dezena de composições que podem fazer parte do próximo álbum, previsto para ser gravado em 2014.
 
Uma das composições é “Mensageiro da Desgraça”. Com versos que falam de problemas sociais crônicos, a composição tem como uma das fontes de inspiração a história do índio pataxó Galdino Jesus dos Santos, que foi incendiado vivo na madrugada do dia 20 de abril de 1997, por cinco jovens de classe média em uma parada de ônibus da W3 Sul, em Brasília.
 
“Vejo meus antepassados / vou vingar os meus irmãos / os que são queimados / enquanto dormem no chão”, diz um dos trechos da canção. “Aquela história do índio queimado aqui [em Brasília] foi muito forte e até hoje ecoa”, afirmou o guitarrista Tony Bellotto.
 
Segundo ele, a banda pesquisava temas musicais indígenas no momento em que estava trabalhando no novo material e a inspiração veio naturalmente. “A ideia da música deu ideia do tema da letra”, disse.
Aquela história do índio queimado aqui [em Brasília] foi muito forte e até hoje ecoa"
Tony Bellotto, guitarrista dos Titãs
 
O assunto não é novidade na história da banda. Em três décadas, os músicos já gravaram composições que vão do pop ao rock pesado, passando pelo reggae, pelo eletrônico, por temas românticos, música brasileira e por covers de Roberto Carlos e Mamonas Assassinas. Entre os diversos temas musicais, está a percussão adaptada de um cerimonial dos índios Xingu na faixa “Cabeça dinossauro”, gravada em 1986.
 
“Essa é uma das influências da música brasileira [no trabalho do grupo]. Acho que a música indígena também é uma coisa muito interessante, que a gente curte e que já estava em ‘Cabeça dinossauro’. Então é algo que faz parte da gente, é mais um elemento”, afirmou o vocalista e multi-instrumentista Paulo Miklos.
Na capital do país
 
No último sábado (26), o quarteto, com o reforço do baterista Mário Fabre, que se juntou à banda desde a saída de Charles Gavin, em 2010, se apresentou em Brasília. A primeira parte do show teve apenas músicas inéditas, como a própria “Mensageiro da desgraça”, “Eu me sinto bem”, “Não pode”, “Terra à vista”, “Fala Renata”, “Flores pra ela”, “Quem são os animais” e “República dos bananas”, uma parceria com o cartunista Angeli.
 
Em seguida o grupo iniciou uma incursão pelos sucessos da banda, começando com “Lugar Nenhum”, passando por “Polícia”, “Diversão”, “Flores”, “AAUU”, “Família”, “Sonífera ilha”, “Desordem”, “Marvin”, “Homem primata”, “A melhor banda de todos os tempos da última semana”, “O pulso”, a versão de “Aluga-se” – de Raul Seixas –, “Bichos Escrotos” e terminando com “Televisão”.
 
“Tocar em Brasília é sempre bacana. Eu acho que dá um barato especial tocar aqui do lado [do poder], aqui próximo, tocando nesses assuntos [de crítica social e política]”, diz Paulo Miklos. “Aqui o brado é mais retumbante.”
“Tem um significado, pelo menos a gente pensa que alguém possa escutar”, afirma Tony Bellotto. “Aqui ‘Vossa Excelência’ tem sempre uma coisinha especial”, diz o vocalista e baixista Branco Mello, ao citar a canção que faz críticas aos políticos brasileiros.
 
Para quem precisa
Os temas sociais, políticos e comportamentais sempre estiveram presentes no trabalho do grupo, desde os primeiros shows. Mais do que tratar dos assuntos polêmicos, a banda sempre procurou a síntese em suas letras, como em “Miséria”, “Igreja”, “Medo”, “Polícia”, “Mentiras”, “Televisão”, “Massacre” e “Polícia”.
 
Vejo meus antepassados / vou vingar os meus irmãos / os que são queimados / enquanto dormem no chão"
Trecho de "Mensageiro da desgraça", música dos Titãs
“A gente não tem uma preocupação de colocar esses temas, mas eles acabam surgindo. De uma forma ou de outra a gente está antenado com isso”, diz Bellotto.
 
“É uma coisa da nossa geração também, até na maneira de tratar os temas de uma maneira direta, não metafórica”, afirma o tecladista, baixista e vocalista Sérgio Britto. Ele cita a música “Desordem” como exemplo. “Até parece uma música circunstancial, mas você vê que no fim nem é. Você fala da estrutura de poder. São coisas que sempre vão existir.”
“Isso que o Britto falou, da linguagem direta, foi uma busca que a gente teve desde o começo, de falar das coisas diretamente”, afirma Bellotto.
 
Paulo Miklos afirma que a banda nasceu e cresceu no momento de pós-ditadura, o que facilitou essa aproximação com esses temas, com críticas às instituições. “Foi o último suspiro da censura. Músicas como, por exemplo, ‘Bichos escrotos’, que foi censurada e depois a gente acabou gravando no ‘Cabeça...’. Era uma coisa que a gente tinha, era uma maneira pra dizer na lata, exatamente, franca e abertamente.”
 
Aqui [em Brasília], o brado é mais retumbante"
Paulo Mikoos
 
Branco Mello lembra que mesmo tendo sido liberada para gravação, “Bichos” acabou censurada. A execução em rádios era proibida por conter palavrões.
 
“Isso é um dado interessante. Em 1986, ainda uma música [é censurada], não por motivo político, mas uma questão moral, esse negócio do palavrão”, afirma Britto.
 
Mesmo com a censura, as rádios acabaram tocando e a composição se tornou sucesso, sendo tocada ao vivo pela banda em todas as turnês. “As rádios começaram a pagar multa pela execução, ficou uma coisa ridícula porque as pessoas pagavam a multa e tocavam a música. E os pedidos eram maiores ainda porque queriam ouvir. ‘Como assim não pode ouvir?’”, diz Miklos.
 
Marca registrada
Do octeto que marcou a formação da banda de 1982 a 1992, apenas quatro membros permanecem na banda. André Jung deu lugar a Charles Gavin, que deixou o grupo em 2010; Arnaldo Antunes e Nando Reis saíram em carreira solo; Marcelo Fromer morreu em 2001 depois de ser atropelado em uma avenida em São Paulo.
 
Apesar disso, e das mudanças nos sons, a essência musical do grupo ainda permanece. “Eu acho que agora a gente está fazendo de uma outra forma, e esse desafio de criar uma coisa nova, mas que tenha a nossa marca, é um equilíbrio legal e instigante pra gente”, diz Bellotto. “Queremos que soe como Titãs e soe como os Titãs também de um jeito novo”, conclui.




Fonte: G1

Comentários

Deixe seu Comentário

URL Fonte: https://arenapolisnews.com.br/noticia/4996/visualizar/