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Opinião
Sexta - 04 de Maio de 2012 às 11:54
Por: Eduardo Mahon

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Fui pobre e não esqueci. Infelizes daqueles que foram ainda meninos e esqueceram-se. Pois não deveriam. Porque a pobreza não ensina nada a ninguém, mas a ascensão com a força do trabalho ministra ensinamentos valiosos sobre o valor das coisas e mais – da amizade, da humildade, da discrição. A pobreza em si não tem mérito algum, mas a superação não deve ser esquecida e esse caminho de luta é a maior fortuna que qualquer pessoa deixa como legado. Porque o importante não é propriamente a riqueza e sim a forma com a qual alguém a construiu, se teve essa oportunidade.

Esse introito era necessário na medida em que uma denúncia, aparentemente anônima, de venda de cargos públicos estaduais, novamente ronda os noticiários locais. A polêmica remete a uma questão: por que alguém teria interesse em comprar uma vaga vitalícia por milhões de reais? Será que essa posição renderia o retorno esperado? O constrangimento com a situação é tamanha que o assunto nem sequer é tratado com atenção pela mídia ou é rapidamente abafado.

Parece absurdo que vivamos sob essa perspectiva, sendo que a corrupção é a única maneira institucional de tratar as coisas e, quando não, reste apenas um estrondoso asco contra a pobreza, imaginando que a polpuda conta bancária vá rechaçar qualquer suspeita. Embora a pobreza esteja suscetível à marginalização e ao crime, pela seletividade dos delitos que temos no nosso sistema penal, é no colarinho branco que devemos nos deter, porque saberemos ao certo se o recrutamento penalizador de uma sociedade é ou não excludente. É o fenômeno que os criminólogos chamam de “cifras negras”, os índices despercebidos de incidência penal.

É nos crimes empresariais, contra a administração, contra o sistema financeiro nacional, que estão ocultos os outros criminosos que não são rastreados pelo sistema seletivo, onde apenas o pobre é colhido, classificado, penalizado, segregado e estigmatizado. Aí sim, de fato, ser pobre é portar uma doença incurável, porque sem contatos e sem condições de fazer frente às acusações, acaba por sucumbir. Nessas condições, ser pobre é estar alijado de muitos direitos, sujeito às intempéries de um capricho, de um longo processo, de decisões sem recursos.

É certo que, por essas razões, a fiscalização sobre os negócios do Estado com particulares devem ser profundamente fiscalizados. E a missão de fiscalizar, controlar, orientar e punir excessos deve estar nas mãos de profissionais que contem com garantias constitucionais tais que sejam insuscetíveis de pressão. Fortalecimento do aparato técnico multidisciplinar, investimento maciço na qualificação do pessoal de apoio, cursos ininterruptos de qualificação, forte aparato tecnológico, são ingredientes essenciais para a contenção da corrupção brasileira endêmica. Mas se faltar honestidade, tudo o mais soçobrará.

É para aqueles que foram pobres e não se esqueçam de suas origens que pontifico a necessidade de discrição, de honestidade, de capacidade. Humildade, além de nunca ter feito mal a ninguém, ajuda o fiscal a fiscalizar primeiro a si mesmo, contendo os próprios excessos, controlando a forte tendência em ceder às tentações do dinheiro fácil. Quem foi pobre e não se esqueceu de suas origens, sabe que a pobreza só se perpetua por meio da corrupção que rouba e mata de forma silenciosa. Quem foi pobre e não se esqueceu de onde veio, sabe que retornará à mesma simplicidade, de mãos vazias e com a leveza de seus méritos ou o peso de suas culpas.


Eduardo Mahon
é advogado.



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