Médicos paulistas irão utilizar células-tronco retiradas da polpa de dentes de leite em tratamento de pessoas com alguma lesão na córnea. O Instituto da Visão da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) começará em setembro a fazer a triagem dos pacientes para aplicar o novo tratamento. A técnica foi desenvolvida pelo Instituto Butantan e pode ajudar a reconstruir os tecidos da córnea de pessoas que sofreram danos por queimaduras ou doenças genéticas e imunológicas.
Durante cinco anos, os pesquisadores utilizaram as células-tronco em coelhos e, em três meses de tratamento, houve recuperação total da córnea das cobaias. Segundo o coautor do projeto, Nelson Foresto Lizier, a autorização para aplicação em seres humanos foi obtida este ano. Ainda não há previsão de quando o tratamento será iniciado, pois será preciso encontrar um grupo homogêneo de pacientes, ou seja, com problema semelhante na córnea, para testar o tratamento e provar que ele é eficaz em certo número de pessoas. Já há dez pessoas indicadas.
"O procedimento cirúrgico é relativamente simples e rápido e o acompanhamento será feito mensalmente durante um bom tempo, ou de acordo com a reação do paciente. Será observada a qualidade da córnea, se ela está ficando transparente, se a pessoa apresenta algum problema com o transplante, e a durabilidade dessa córnea, já que o objetivo é o de que a transparência dure para sempre", disse Lizier.
Ele também explicou que os dentes de leite são doados por pacientes do hospital e as células encontradas na polpa (tecido mole) do dente tem características muito semelhantes às da córnea. Para retirar as células, os profissionais mexem no interior do dente, que fica aberto quando cai, e depositam o tecido em uma placa de cultura onde as células-tronco se multiplicam em grande escala. As células se reproduzem sobre uma fina camada estrutural para ganhar o formato de uma córnea de fato.
"Nos seres humanos nós transportaremos essa película para o olho e em seguida colocaremos uma lente de contato para segurar a película. Assim que as células estiverem seguras, essa lente é retirada", disse.
O pesquisador afirmou que o que poderia dar errado com essa técnica seria a devolução da qualidade da córnea por um curto período e, assim, o indivíduo precisar de uma nova operação. "Na pesquisa com os coelhos, aqueles que precisaram de uma segunda cirurgia foram os que tinham a córnea muito danificada. Mas na segunda operação a integridade da córnea foi recuperada. Pelos resultados que tivemos com os coelhos a expectativa é a de que dê certo com humanos".
Ele disse que o procedimento é vantajoso porque não é invasivo e apresenta baixo risco para o paciente. Além disso, as células-tronco do dente de leite são imunoprivilegiadas, isto é, dificilmente seriam rejeitadas pelo organismo receptor. "Isso quer dizer que provocam baixa resposta imune do organismo, permitindo que sejam utilizadas células de parentes para a doação e até mesmo de pessoas que não sejam ligadas ao paciente".
De acordo com Lizier, o custo de todo o procedimento laboratorial não passa de R$ 500. A técnica já é estudada para a utilização em outros tipo de doenças de visão, ossos, cartilagens e tecidos nervosos.
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