Pesquisa comprova desconhecimento da população em relação a gripe e resfriado
A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), preocupada com a falta de informação da população em relação à saúde respiratória, encomendou junto ao instituto de pesquisa Datafolha pesquisa inédita no país. Denominado Saúde Respiratória e do Pulmão, o estudo comprova o desconhecimento sobre tais males, colocando os médicos pneumologistas em estado de alerta, pois o atraso em diagnóstico e tratamentos, na especialidade, evolui rapidamente para quadros bem mais graves.
Entre as principais conclusões destaque para o fato de mais de 70% da população desconhecer como se chega ao diagnóstico da gripe. Também foi muito alto o índice de pessoas que confessam se automedicar e fazer uso de receitas caseiras na tentativa de sanar o problema que pode, inclusive, levar à morte, como é o caso da gripe A.
A desinformação, segundo os resultados do levantamento, começa já na prevenção das doenças respiratórias, que é extremamente importante para a redução dos altos índices existentes no país, especialmente no caso das contagiosas, como a gripe e o resfriado. Mas como é possível a população se prevenir sem informação? E esta foi uma das constatações da pesquisa.
Tanto a gripe, como o resfriado, explica a dra. Jussara Fiterman, presidente da SBPT, são infecções respiratórias causadas unicamente por vírus. “A maior prevalência no inverno é justificada pelo aumento da aglomeração de pessoas em locais menos ventilados, facilitando a disseminação do vírus e consequente contaminação”.
No entanto, 81% dos entrevistados acreditam erroneamente que as doenças podem ser causadas ou agravadas pelo clima frio ou úmido. Também houve quem dissesse que o problema está no ar-condicionado (54%), pó ou poeira (50%), poluição (38%) ou cigarro (29%). A confusão é tanta que não fumar foi apontado pela a grande maioria (63%) como a principal medida preventiva para estas doenças pulmonares infecciosas.
Para o dr. Roberto Stirbulov, presidente-eleito da SBPT, algumas das respostas equivocadas da população sugerem mais do que desinformação. “Dados como estes, e especialmente frente à grande citação de ar condicionado, pó e poeira, sugerem que as pessoas possam estar confundindo a asma ou a rinite à gripe ou resfriado. São portadores de doenças crônicas que acreditam que, a cada episódio, estejam contraindo novo resfriado”.
Gripe ou resfriado?
Devido à grande desinformação sobre as diferenças entre gripe e resfriado, o estudo considerou ambas as doenças como se fossem uma única, embora não sejam.
O resfriado é transmitido pelo contato direto pessoa-a-pessoa, por meio das gotículas eliminadas ao falar, tossir ou espirrar. Já a gripe, causada por diversos vírus, todos da família Influenzae, entre eles o H1N1, dissemina-se principalmente pelo ar, difundido por gotículas produzidas durante a tosse, pelos espirros, ao falar, e também após o contato das nossas mãos com toalhas, corrimãos, maçanetas etc, previamente contaminadas com secreções respiratórias de pacientes com a doença.
“A gripe, assim como o resfriado, pode ser causada por diferentes tipos de vírus. O mais importante, no entanto, é que a população saiba que a grande diferença entre as doenças está na gravidade. A gripe, que tem os sintomas mais severos, trazendo mais desconforto ao paciente, é a mais perigosa e pode levar à sérias complicações, necessitar de internação e, inclusive, levar à morte”, alerta a dra. Marina Lima, diretora científica da SBPT.
Portanto, além de evitar aglomerações e ambientes pouco ventilados, a correta higienização das mãos é essencial para redução da contaminação. “As principais recomendações para prevenção da transmissão são lavar as mãos com água e sabão com frequência, cobrir o nariz e a boca ao tossir; procurar não colocar a mão nos olhos, boca ou nariz; não compartilhar alimentos e utensílios e evitar aglomerações ou ambientes pouco ventilados”, afirma dra. Jussara.
Visão equivocada das vacinas
Ainda, no caso da gripe, há a vacinação, tanto para a sazonal quanto para a gripe A, que devem ser tomadas anualmente. Aqui outra constatação estarrecedora. Mesmo após as campanhas para a vacinação tanto da gripe sazonal, voltada especialmente para a terceira idade, como para a gripe A, realizada maciçamente em específicos grupos há poucos meses, para 17% “uma única dose da vacina de gripe é suficiente para proteger a pessoa por toda a vida”.
“Já estão disponíveis no Brasil duas vacinas distintas, uma para a gripe sazonal, outra para a gripe A. A primeira deve ser tomada anualmente por conta da grande capacidade de mutação do vírus da gripe, além do fato de os anticorpos produzidos pela vacina diminuírem com o tempo. O mesmo deve acontecer a partir do próximo ano no caso da vacina contra a gripe A”, explica dra. Jussara.
Sintomas e tratamento
Gripe e resfriado têm sintomas e tratamentos específicos. O resfriado é o mais comum, não é grave e dura aproximadamente quatro dias, possui como sinal característico a coriza, inicialmente aquosa e abundante, que torna-se viscosa, espessa e de cor amarelo-esverdeada. Também pode haver queixa de obstrução nasal, tosse, espirros, dor de cabeça, dor de garganta e febre baixa.
A gripe é mais grave e costuma durar mais de uma semana. Além dos sintomas do resfriado, causa febre alta, dores pelo corpo e fadiga. Outras consequências menos frequentes são sinusite, otite média, descompensação do diabetes mellitus, agravamento de doenças pulmonares crônicas, insuficiência e/ou arritmias cardíacas.
Alguns dos principais sintomas, comuns a ambas doenças, foram citados na pesquisa, como febre/calafrio (50%), tosse (43%), coriza (45%), indisposição (45%). No entanto, outros sintomas que não estão relacionados às doenças também foram registrados pelos pesquisadores, tais como falta de ar, chiado no peito, falta de apetite, emagrecimento. Além disso, 2% dos entrevistados que afirmaram conhecer as doenças não souberam especificar um único sintoma.
Índices de automedicação são perigosos
O diagnóstico da gripe ou do resfriado é essencialmente clínico, realizado em consultório médico, por meio de exame físico e de uma conversa com o especialista sobre as queixas do paciente. No entanto, somente 2% das pessoas responderam que não é necessário realizar nenhum exame complementar. Um fato alarmante foi que 36% dos entrevistados não souberam dizer como se pode detectar a doença. Outros grupos sugeriram, equivocadamente, exames como a escuta do pulmão (36%), raio-x (22%), ou o teste do escarro (12%), utilizado no diagnóstico da tuberculose, além de citações de tomografia, espirometria, broncoscopia, e até de exames de sangue.
O grave problema da automedicação no Brasil também foi constatado na pesquisa. Um total de 43% das pessoas afirmaram tomar medicamentos como antigripais, antitérmicos, analgésicos e injeções por conta própria. As receitas caseiras, como sopas, chás, mel ou xaropes feitos artesanalmente são a solução encontrada por 39%. Apesar de a maioria concordar com a afirmação “quando uma pessoa pega gripe ela deve procurar um médico”, apenas 19% o fizeram nos últimos 12 meses.
“Os medicamentos só devem ser prescritos por médicos. Caso contrário, seu uso inadequado pode elevar o nível de resistência bacteriana na população, aumentando a gravidade de futuras infecções respiratórias causadas por bactérias. Além disso, em grande parte das gripes e resfriados, a administração de antibióticos não é indicada, visto que se tratar de infecção viral, ou seja, esses medicamentos não têm ação”, afirma dr. Roberto Stirbulov.
Também foi possível observar que o uso de receitas caseiras é maior entre os moradores do Nordeste, entre os mais velhos, entre os pertencentes às classes D/E e entre os com escolaridade fundamental, enquanto a procura por um médico é mais expressiva entre as mulheres.
Quem é o pneumologista?
Um dado que assustou os médicos pneumologistas foi que 29% não sabem a que especialista recorrer em caso de gripe. O clínico geral foi o mais citado, com 59% das respostas. Enquanto que o pneumologista, especialista em doenças do sistema respiratório, como a gripe, recebeu somente 5% das citações. Outras citações, em menor quantidade, foram otorrinolaringologista (1%), infectologista (1%) e alergista (1%).
O pneumologista é médico especialista na saúde respiratória. Doenças que afetam todo o sistema respiratório, que vai do nariz aos pulmões, são de sua alçada e devem ser encaminhados para sua avaliação.
“Uma confusão muito grande é associar o pneumologista somente às doenças do pulmão. Mas o médico pneumologista trata de todo o trajeto que o ar percorre na respiração, e que pode ser prejudicado por doenças como asma, rinite, tuberculose, gripe, resfriado, câncer de pulmão, pneumonia, além de outras menos conhecidas, como a fibrose cística, DPOC ou hipertensão pulmonar”, explica a presidente da SBPT.
A pesquisa
Com o objetivo de levantar junto à população brasileira mais informações sobre o seu conhecimento acerca da saúde respiratória e dos males que a atingem, foram entrevistados 2242 brasileiros com 16 anos ou mais, pertencentes a todas as classes econômicas, em uma pesquisa quantitativa, com abordagem pessoal, em pontos de fluxo populacional.
As entrevistas foram realizadas mediante aplicação de questionário estruturado, com cerca de 20 minutos de duração, distribuídas em 143 municípios, com margem de erro máxima de 2 pontos percentuais para mais ou para menos, dentro do nível de confiança de 95%.
O desenho amostral foi elaborado com base em informações do Censo 2000/ estimativa 2009 (Fonte: IBGE), com a[m1] estratificação por Unidade Federativa e porte dos municípios, de acordo com os pesos das regiões brasileiras, de forma a representar o universo estudado.
Desta forma, 39% dos entrevistados residem na região Metropolitana e 61% no interior. A maioria deles possuía entre 16 e 44 anos (63%), tem filhos (62%), possui escolaridade fundamental (47%), pertence à classe C (48%), faz parte da população economicamente ativa (68%), possui renda familiar até R$ 1.020,00 (até 2 salários mínimos), reside na região Sudeste (43%)
O conhecimento da gripe e do resfriado foi medido em dois estágios. Primeiro, por meio de pergunta com resposta espontânea, e depois estimulando as doenças.
Embora altamente prevalentes, resfriado e gripe, incluindo tanto a sazonal quanto a causada pelo vírus H1N1, foram citadas[m2] espontaneamente apenas por 19% dos entrevistados quando questionados sobre as doenças respiratórias que conheciam. As mais citadas foram asma (44%), bronquite (40%). Pneumonia apareceu em seguida, citada por 24%. [m3] Também receberam menções tuberculose[m4] , rinite alérgica, câncer de pulmão, enfisema pulmonar, sinusite, DPOC, hipertensão pulmonar, embolia pulmonar, alergia, distúrbios do sono, apneia, fibrose cística.
Um dado preocupante foi que 15% não souberam [m5] citar uma única doença pulmonar e, ainda, a média entre os entrevistados foi de 2,1 doenças conhecidas.
Depois de estimulados, com uma lista de doenças, que incluía não apenas a gripe e o resfriado, mas também a asma, pneumonia, tuberculose, embolia pulmonar, câncer de pulmão[m6] , enfisema, bronquite, rinite, hipertensão pulmonar, distúrbios do sono, DPOC e fibrose cística, a gripe e o resfriado foram apontadas por 99%[m7] das pessoas como sendo doenças de seu conhecimento.
Com relação às outras doenças, após conferir a lista, foram apontadas como doenças conhecidas: asma (96%), pneumonia (96%), bronquite (95%) tuberculose (94%), câncer de pulmão (90%), rinite alérgica (72%), enfisema pulmonar (58%) distúrbios do sono (53%).
Tanto o conhecimento espontâneo quanto o estimulado de doenças respiratórias foi mais expressivo nas classes A/B e aumenta à medida que cresce a escolaridade.
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