Pelo menos 27 deles respondem pelo caso na Justiça
39 acusados por CPI são candidatos; três são de MT
Escândalo que envolveu o maior número de parlamentares em todas as legislaturas, a chamada máfia das ambulâncias resultou na abertura de processos de cassação contra 69 deputados e três senadores em 2006. Ninguém foi cassado. Mas apenas sete se mantêm no Congresso até hoje. Quatro anos depois, 39 dos 72 congressistas denunciados pela CPI dos Sanguessugas correm atrás agora de um novo mandato.
Entre os candidatos, 27 ainda têm contas a acertar com a Justiça Federal de Mato Grosso, onde tramita a maioria dos processos desencadeados pela Operação Sanguessuga, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. É o que revela levantamento feito pelo Congresso em Foco. De olho no voto do eleitor, eles respondem pelos crimes de quadrilha ou bando, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Na lista dos processados estão, por exemplo, os ex-deputados Nilton Capixaba (PTB-RO) e Cabo Júlio (PMDB-MG), que deixaram a Câmara com parecer do Conselho de Ética pela cassação de seus mandatos. A falta de prazo após a decisão do Conselho impediu a análise dos pareceres pelo Plenário antes do término da legislatura que acabou em 31 de janeiro de 2007.
Vereador em Belo Horizonte, Cabo Júlio foi o primeiro parlamentar condenado em primeira instância por envolvimento com a máfia das ambulâncias, em agosto do ano passado.
Apontado pela CPI como um dos líderes do “braço político” do esquema de venda de emendas parlamentares e superfaturamento de ambulâncias, Nilton Capixaba foi acusado de receber R$ 631 mil do esquema, o segundo maior montante dentre todos os congressistas. De acordo com pesquisas locais, ele aparece na quarta colocação na disputa por uma vaga de deputado federal por Rondônia.
O Congresso Nacional é o principal objeto de desejo dos candidatos que tiveram o nome, de alguma forma, associado à máfia das ambulâncias: 24 buscam um mandato na Câmara dos Deputados e três, de senador. Outros dois disputam vaga de suplente de senador e dez concorrem a deputado estadual.
Nova chance
O Congresso em Foco procurou os ex-parlamentares denunciados pela CPI dos Sanguessugas que buscam um novo mandato. Entre os que retornaram o contato feito pela reportagem, o sentimento é de que o eleitor está disposto a lhes dar uma nova chance. Acusados de receber propina em troca de emendas para a compra de ambulâncias, todos alegam inocência e se dizem vítimas de denúncias caluniosas dos empresários Luiz Antônio Vedoin, Darci Vedoin e Ronildo Medeiros, sócios da Planam, empresa que encabeçava o esquema. Os empresários também respondem criminalmente à Justiça.
“Lamentavelmente no Brasil, a palavra de um marginal, corrupto ou ladrão vale mais do que a palavra de um representante do povo. Se o marginal acusa, não precisa provar nada. Para a mídia, tudo passa a ser verdade, e o representante do povo então tem que provar que é inocente. Há uma clara inversão do ônus da prova”, reclama a ex-deputada federal Edna Macedo (SP), candidata a deputada estadual pelo PSL.
Edna diz que está provando sua inocência na Justiça e que, em vez de enriquecer, empobreceu durante o mandato na Câmara. “Perante a Justiça estou provando a minha inocência até porque inexiste qualquer prova de meu enriquecimento ilícito. A bem da verdade, durante o meu mandato de deputada federal fiquei mais pobre e os membros da minha família também. Nunca ostentei sinais de riqueza”, afirma.
A candidata acrescenta que não tem motivos para se envergonhar. “Sou serva de Deus e tenho a consciência tranquila de que exerci o meu mandato com dignidade, honestidade e a acima de tudo com lealdade aos meus eleitores e amigos. Ando de cabeça erguida e pedindo voto a cada pessoa que encontro”, declara a ex-deputada, irmã do bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, e tia do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ).
“Denuncismo” e leviandade
De olho em uma nova cadeira na Câmara, Nilton Capixaba classifica como “levianas” as acusações de que teria participado da máfia das ambulâncias. Segundo ele, a confirmação de sua candidatura pelo Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, por unanimidade, reforça sua idoneidade. Em mensagem enviada por sua assessoria, o ex-deputado critica a retomada do assunto pela reportagem.
“O candidato acredita que este episódio de denuncismo pode ter sido encomendado por adversários para tentar desestabilizar sua candidatura que está forte nos quatro cantos de Rondônia. Nilton Capixaba acredita na Justiça e tem certeza de que a população vai saber discernir este momento lamentável da política de Rondônia”.
Presidente do diretório estadual do PTB, Capixaba diz que apenas direcionava as emendas e que não podia, por isso, responder pela execução delas. “Vale ressaltar que o papel do parlamentar é simplesmente direcionar as emendas. Quem realiza a compra e a aquisição do objeto é a prefeitura e quem aprova os projetos para aquisição das ambulâncias é o Ministério da Saúde” destacou Nilton Capixaba.
Candidato a senador pelo PSC de Rondônia, Agnaldo Muniz também se diz vítima de perseguição política. “Provei minha inocência. Foi maracutaia do PMDB. Todas as testemunhas me inocentaram. A Polícia Federal diz que nada foi encontrado a meu respeito. O negócio é direcionado só para prejudicar minha campanha”, protesta o ex-deputado, que ainda responde a processo na Justiça Federal de Mato Grosso pelo caso.
“Precisava me afastar daquele rolo”
Coriolano Sales (BA) aguarda o desfecho do julgamento da Lei da Ficha Limpa para saber se poderá assumir o mandato caso seja eleito em outubro. Ele e Marcelino Fraga (PMDB-ES), hoje candidato a deputado estadual, foram os únicos a renunciar ao mandato às vésperas da abertura do processo de cassação no Conselho de Ética. Por causa disso, a candidatura dos dois está sendo contestada na Justiça eleitoral.
O ex-deputado baiano do PFL, que tenta retornar à Câmara pelo PSDB, diz que jamais teve contato com qualquer integrante da máfia das ambulâncias e que não se arrepende de ter renunciado, mesmo vendo que nenhum de seus colegas acusados foi cassado.
Coriolano afirma que não poderia “adivinhar” que a lei da ficha limpa, sancionada quatro anos depois, pudesse retroagir. Ele diz ter decidido deixar a Câmara à época para tentar assumir um mandato-tampão na prefeitura de Vitória da Conquista (BA). Segundo colocado na disputa municipal de 2004, Coriolano esperava ser convocado para substituir o então prefeito, cassado pela Justiça eleitoral. “Precisava me afastar daquele rolo”, lembra, em referência à máfia dos sanguessugas.
O candidato diz ter sofrido sérios prejuízos políticos com a denúncia, segundo ele, jamais provada. “Pago essa conta até hoje”, declarou Coriolano. O Congresso em Foco deixou recados no celular de Marcelino Fraga, mas não teve retorno.
Julgamento das urnas
Agora, diz Bengtson, a disputa está bem mais difícil. Se antes o PTB precisava de 30 mil votos para eleger um deputado, cada um deve buscar ao menos 100 mil, nas contas do candidato. Tudo por causa da coligação com um número maior de partidos.
Bengtson e Heleno Silva não foram os únicos a não tentarem um novo mandato no calor das denúncias de 2006. Outros 22 denunciados pela CPI dos Sanguessugas não disputaram a eleição. Dos 50 que se arriscaram ir às urnas, apenas cinco se reelegeram: Wellington Roberto (PR-PB), Marcondes Gadelha (PSB-PB), Pedro Henry (PP-MT), Wellington Fagundes (PR-MT) e João Magalhães (PMDB-MG).
Entenda o caso: o que foi a Operação Sanguessuga
Em Mato Grosso
PEDRO HENRY
(PP-MT), candidato à reeleição de deputado federal
Foi um dos deputados denunciados pela CPI dos Sanguessugas. No dia 20/12/06, o Conselho de Ética arquivou a denúncia contra o deputado, alegando que o pedido da CPI era “inepto”, pois não havia indícios da participação dele no esquema de irregularidades. Reelegeu-se em 2006.
Acusação e defesa
O empresário Luiz Antônio Vedoin diz que entregou a Pedro Henry uma Blazer zero quilômetro avaliada em R$ 48 mil, financiada em nome dos donos da Planam. Em troca, o deputado direcionou dinheiro público para compra de ambulâncias no oeste de Mato Grosso, segundo a denúncia. Darci Vedoin diz que Henry vendeu o carro entre 2005 e 2006, devolvendo o valor à Planam. Em defesa entregue à Câmara, o parlamentar cita depoimento em que Luiz Antônio Vedoin diz ter emprestado o veículo para ajudá-lo na campanha eleitoral. "O que eu fiz para o deputado Pedro Henry foi uma ajuda de campanha, na qual emprestei uma camionete e ele me devolveu. Foi vendida, e o dinheiro foi depositado na minha conta", afirmou o empresário da Planam. Henry negou acerto de comissão com os Vedoin.
O Congresso em Foco não localizou o deputado Pedro Henry. Enviou mensagem de correio eletrônico ao gabinete. Não houve retorno. Ninguém foi localizado no gabinete do parlamentar. Na última vez em que o site tentou contato com Henry, o deputado também não retomou contato com o site.
SERYS SLHESSARENKO
(PT-MT), candidata a deputada federal. É senadora.
A senadora teve o pedido de indiciamento pela CPI dos Sanguessugas, mas, depois disso, nenhuma acusação foi comprovada. Foi absolvida pelo Conselho de Ética do Senado.
Acusação e defesa
Serys foi acusada de envolvimento com a “máfia das ambulâncias” depois que Luiz Antônio Vedoin disse ter entregue um cheque de R$ 35 mil a um genro da parlamentar em troca de emendas para a compra de ambulâncias da Planam.
O empresário disse não ter tido contato com Serys. O genro da senadora negou ter negociado emendas. Segundo ele, o dinheiro fazia parte de um pagamento pela compra de equipamentos hospitalares. A denúncia foi arquivada por unanimidade no Conselho de Ética. Segundo o relator, o ex-senador Paulo Octávio (DF), não havia prova de envolvimento da parlamentar com o esquema. "Não existem provas de qualquer acordo da senadora por emendas. Não há omissão na sua conduta", afirmou. "Não foi provado que o genro da senadora estava autorizado a falar em seu nome. Não foi constatada prática incompatível com o decoro da senadora", acrescentou.
O filho e advogado de Serys, Alexandre Slhessarenko, informou ao Congresso em Foco que a CPI dos Sanguessugas realmente pediu o indiciamento da mãe dele. Mas destacou que, no âmbito do Congresso, o Conselho de Ética arquivou o caso. E, no plano judicial, a Procuradoria Geral da República sequer pediu investigação da senadora. A assessoria da Polícia Federal confirmou ao site que não foi aberto inquérito contra Serys.
Alexandre destaca que, dos 86 envolvidos inicialmente no caso, o procurador geral da República só isentou Serys e um deputado. Ele cita ainda uma decisão da Justiça do Mato Grosso, em que o magistrado afirma que a família Vedoin não faz acusações contra a senadora, mas contra o genro dela. Por fim, Alexandre Slhessarenko destaca que o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu certidão de “nada consta” à senadora sobre a Operação Sanguessuga. Veja certidão referente ao período até julho de 2007.
Para exemplificar o fato de que a senadora Serys não tem nada a ver com a máfia, o filho da parlamentar enviou uma sentença em que ela perdeu uma disputa com a família Vedoin. A senadora queria que os donos da Planam fossem condenados por calúnia, injúria e difamação por conta do que Luiz
Antônio e Darci Vedoin disseram à CPI das Ambulâncias e à Justiça Federal. Mas o juiz considerou que não houve ofensa a Serys. “As supostas ofensas não foram proferidas contra ela, mas contra seu genro”, diz o magistrado na decisão, de julho de 2007. “Não foi a senadora Serys Slheressarenko e sim o seu genro sr. Paulo Roberto, quem supostamente teria praticado as condutas ilícitas.” A decisão enviada ao Congresso em Foco, que não cita o nome do juiz e a vara onde trabalha, condenou Serys ao pagamento das custas judiciais do processo. Veja íntegra da decisão
WELLINGTON FAGUNDES
(PR-MT), candidato à reeleição de deputado federal. Era do PL, antiga denominação do PR
Foi um dos deputados denunciados pela CPI dos Sanguessugas. No dia 22/12/06, o Conselho de Ética arquivou a denúncia contra o deputado, alegando que o pedido da CPI era “inepto”, pois não havia indícios da participação dele no esquema de irregularidades. Reelegeu-se em 2006.
Acusação e defesa
O empresário Luiz Antônio Vedoin afirma que pagou R$ 100 mil em espécie ao deputado Wellington Fagundes, sendo parte por intermédio de um assessor. A ex-servidora do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino citou o deputado como um dos envolvidos no esquema.
Em sua defesa, Fagundes nega recebimento de propinas em troca de direcionamento de licitações ou qualquer acordo com os donos da Planam. Afirma que seu gabinete não tinha contato rotineiro com os Vedoin. Fagundes diz que tinha ouvido falar na atuação da Planam somente porque era empresa de seu estado.
A assessoria do deputado Wellington Fagundes encaminhou ao site sentenças do juiz José Pires da Cunha, da 5ª Vara Federal do Mato Grosso, de abril de 2007, na qual ele absolve o deputado de participação na máfia das ambulâncias. O magistrado afirma que o parlamentar sequer apresentou emendas entre 2001 e 2003. Em 2004, as duas emendas para compra de ambulâncias resultaram em licitações que não beneficiaram as empresas da família Vedoin, disse Cunha. Relatório da Controladoria Geral da União confirma a informação. Por causa disso, o juiz rejeitou a denúncia do Ministério Público por improbidade administrativa conta Fagundes. Em recurso do MP, o magistrado determinou extinção do processo.
Leia a íntegra da decisão judicial
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