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Política
Segunda - 11 de Outubro de 2010 às 14:04
Por: Marcy Monteiro Neto

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Dia 11 de outubro de 1977. Foi naquele dia, 33 anos atrás, que o então presidente do Brasil, Ernesto Geisei, assinou a Lei Complementar número 31 que dividia Mato Grosso e criava o Estado de Mato Grosso do Sul.

O engenheiro civil sergipano José Garcia Neto era o governador do Estado na época. Garcia Neto morreu no ano passado. Dois anos antes, ele concedeu uma entrevista ao site da TV Centro América para falar sobre o processo de divisão de Mato Grosso, que ele classificava como "uma barbaridade". O político defendera, até os últimos instantes, a manutenção do Estado uno.

José Garcia Neto, quando veio a Mato Grosso para trabalhar muitas décadas atrás, não imaginava que se tornaria um personagem importante na história do Estado. Aos 85 anos, munido de documentos, livros e de uma memória prodigiosa, Garcia Neto recebeu a reportagem do site da TV Centro América no escritório dele, em 2007, para lembrar o processo que levou à divisão do Estado.

Sentado à cabeceira de uma mesa de reuniões, o ex-governador fez um alerta logo no início da entrevista, que acabaria em um bate-papo de mais de duas horas. "Sempre fui contrário à divisão". Ele fez questão de ressaltar os aspectos que o levaram a se posicionar contra o presidente Geisel e questionava se a decisão do general foi acertada.

Garcia Neto foi prefeito de Cuiabá e também eleito deputado federal por duas vezes. Quando cumpria o segundo mandato na Câmara dos Deputados, foi convidado por Geisel para ser o vice-líder de governo. O presidente demonstrava que pretendia fazer, aos poucos, a abertura política. Para isso, precisava de aliados. Essa proximidade com o presidente fez com que Garcia Neto conquistasse a simpatia e confiança de Geisel.



O então deputado federal foi indicado pelo partido dele, a Arena, para ser candidato dentro da sigla ao governo do Estado. Garcia Neto não queria ser candidato, mas os correligionários o apontavam como o melhor nome para governar Mato Grosso. Até o próprio governador José Fragelli apoiou a candidatura de Garcia. "Eu não era candidato. Fragelli fez uma lista tríplice e colocou o meu nome. Meu candidato era Ênio Vieira, presidente da Arena em Mato Grosso. Acabei aceitando na última hora", lembra. E foi escolhido pelo presidente para governar o Estado.

Garcia Neto disse que estava pré-disposto a governar "contra a divisão e a favor de um governo democrático". Para tanto, dividiu as secretarias entre pessoas do norte e sul do Estado. "Fiz um entrosamento. O vice era Cássio Leite de Barros, de Corumbá, escolhido por mim", frisou.

Processo de divisão

Garcia Neto explicou que um processo de disputa política e econômica resultou na divisão de Mato Grosso e na criação de Mato Grosso do Sul. Ele afirmou que o povo cuiabano era contra a divisão e que ele tinha a intenção de desenvolver o Estado unindo as forças do sul e do norte.

O governador contou que a grande "desculpa" para justificar a divisão do Estado era que Mato Grosso era muito grande e difícil de governar. Logo depois da posse, em 1975, Garcia Neto se reuniu com o presidente Geisel para externar a preocupação sobre a possível divisão. "Disse ao presidente sobre o que os jornais e a população comentavam referente à divisão. Disse também que eu era contra e que queria saber a opinião dele. O presidente disse que não havia pensado ainda no assunto mas, quando fosse pensar, que eu seria o primeiro a saber. Desta forma, não toquei mais no assunto".

Para Geisel voltar a "pensar" no assunto demorou dois anos. Foi em abril de 1977 que o general chamou Garcia Neto para tratar da divisão. "Ele disse que queria começar a pensar na divisão de Mato Grosso. Pedi para dar minhas razões contrárias e as encaminhei em forma de um documento".

Garcia Neto elaborou um documento chamado "Exposição de motivos apresentada ao Exmo. senhor Presidente da República Ernesto Geisel pelo Governador de Mato Grosso José Garcia Neto", datado de 27 de abril de 1977. Apresentou 13 itens para justificar a necessidade do Estado uno e contra a divisão. "Mato Grosso, a despeito de suas dimensões (...) é hoje um Estado consolidado e satisfatoriamente integrado pelos meios modernos de transporte e comunicação. (...) Suas receitas correntes são maiores que as despesas correntes, o que não ocorre com algumas unidades da federação", esclareceu.

O governador também ressaltou que "dividir Mato Grosso seria transformar um Estado financeira e economicamente consolidado em duas unidades inviáveis". Ele argumentou que a divisão contrariava a tese das fusões que visam a diminuir despesas administrativas. Garcia disse que "a divisão do Estado, com o conseqüente enfraquecimento de sua capital, iria atrasar o processo de integração dessa rica e cobiçada região".

Outra preocupação do governador era sobre o que fazer com os 5.318 funcionários públicos do Estado. Com a divisão, avaliou Garcia Neto, os órgãos sediados em Cuiabá teriam suas atribuições diminuídas, restando duas opções: demitir servidores ou continuar com eles recebendo recursos de outras fontes "para cobrir onerosa folha de ociosos".

Custo alto da divisão

Garcia Neto, na justificativa ao presidente Geisel contra a divisão do Estado, disse que o desequilíbrio financeiro que a divisão provocaria geraria problemas diversos. "O governo federal teria, para solucioná-los, que carrear grandes recursos para custeio de administração dos dois estados, os quais somariam, no primeiro ano, cerca de Cr$ 380 milhões, a preços de 1977, quando neste mesmo ano o orçamento de Mato Grosso apresenta um superávit de Cr$ 70 milhões".

O então governador disse que, com a divisão, não haveria recursos para manter duas máquinas administrativas, pois seria preciso construir mais uma Assembleia Legislativa, mais um Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas e criar mais 15 ou 20 secretarias de governo. Para exemplificar o problema, Garcia Neto recorreu, ironicamente, a uma comparação. Disse que é semelhante a um homem casado que tem uma "filial", uma amante. "A despesa dobra. Ter uma filial aumenta os gastos. Se Mato Grosso tivesse unido, só perderíamos em receita para os estados do sul".

Geisel decide dividir MT

De 15 a 20 dias após receber o documento, Geisel convocou uma audiência com Garcia Neto e anunciou que, mesmo com toda a justificativa, optara pela divisão de Mato Grosso. "Ele disse que leu bem as minhas razões, mas que Mato Grosso com tantas potencialidades, e quando se igualasse a São Paulo, poderia abalar o conjunto da federação brasileira. Era uma visão muito militarista", disse. O medo de Geisel era de que Mato Grosso crescesse e decidisse brigar pela independência com relação ao restante do país, qual tentara estados do sul do Brasil. A decisão de dividir o Estado foi tomada em abril de 1977, seis meses antes da assinatura da lei. A divisão efetivamente aconteceu em janeiro de 1979.

"Mato Grosso não morreu porque os patrícios do sul do país, os patrícios de São Paulo, do Rio, do Espírito Santo, nordestinos aqui chegaram. Fizeram uma bela invasão às terras nossas e Mato Grosso é o que é. Porque Mato Grosso, quando foi dividido, era um terço do Estado [em arrecadação]. Hoje Mato Grosso é maior do que Mato Grosso do Sul. Porque esses nossos patrícios vieram aqui e foram recebidos por um pessoal sui generis, que é o cuiabano. O cuiabano sabe receber. Posso falar assim porque sou de fora. Todos que chegam aqui são bem recebidos como se fossem irmãos que não se viam há algum tempo. E isso tornou essa grandeza que hoje é Mato Grosso", frisou o ex-governador.

Novos projetos de divisão

No Congresso Nacional tramitam outros projetos de lei que propõe novas divisões ao Estado, como um que trata da criação do Estado do Araguaia e outro sobre a criação do Estado de Mato Grosso do Norte. Garcia Neto também reclamou dos novos projetos. "Estão perpetrando um crime contra Mato Grosso. Dividir novamente Mato Grosso é crime. Só pode servir para políticos que fazem política com "p" minúsculo. Para o Estado não serve, pelo contrário. Se estão querendo isso, não são amigos de Mato Grosso", concluiu.
 




Fonte: TVCA

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