"Vivemos uma quase laicidade", diz sociólogo sobre campanha eleitoral
"Vivemos uma quase laicidade", definiu o sociólogo Ricardo Mariano, da PUC-RS, ao comentar a participação ativa das igrejas na atual campanha eleitoral, em mesa redonda que historiou os cem anos do pentocostalismo no Brasil, no encontro anual da Anpocs.
Segundo Mariano, a influência da religião na política aumenta porque existe uma "instrumentalização mútua" entre governo, partidos políticos e igrejas. "Se não houvesse tanta barganha, as autoridades religiosas não teriam tanto poder quanto têm."
O sociólogo lembrou que, embora a separação entre igreja e Estado tenha vindo com a primeira Constituição da República, em 1891, ela foi assediada desde o início pela Igreja Católica. Devido à enorme hegemonia desta, os protestantes se mantiveram durante décadas fora da política e como defensores do Estado laico.
A ação da Liga Católica contribuiu para a obtenção de privilégios na Carta de 1934, como os crucifixos nas repartições, os padres capelães e o financiamento de escolas e hospitais. Até o Concílio Vaticano 2º, que consagrou o ecumenismo nos anos 60, as demais igrejas e cultos afrobrasileiros e espíritas eram tratados com aberta discriminação.
Embora desde os anos 50 já exista um "mercado religioso" no país, com a disputa de fieis pelas várias denominações, a competição na esfera pública só vem com a consolidação da neopentecostal Iurd (Igreja Universal do Reino de Deus), no final dos anos 80. "Foi uma corrida por canais de TV e rádio", diz Mariano.
Na eleição de 1989, os evangélicos apoiaram maciçamente Collor; em 2002, a Iurd aderiu ao PT no segundo turno. Neste pleito, a Iurd está com a petista Dilma, enquanto a maior parte da Assembleia de Deus apoia o tucano José Serra.
O Censo de 2000 registrou 15% de evangélicos na população --proporção que, estima-se, deve aumentar para cerca de 25% quando foram divulgados o resultado do Censo deste ano.
Mas Lula assinou, em 2008, uma polêmica Concordata com a Santa Sé, que passou no Congresso com a oposição apenas do PSOL. Há uma ação no Supremo Tribunal Federal que alega a inconstitucionalidade do acordo --o apoio ao ensino religioso seria contrário à Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
Um parlamentar ligado à Iurd, em resposta, fez a Lei Geral das Religiões, baseada no argumento da isonomia entre os vários cultos. O projeto continua em tramitação. "Há muitos litígios relacionados à questão da laicidade estatal", diz Mariano.
Comentários