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Saúde
Sábado - 13 de Novembro de 2010 às 14:24

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Na última semana o aborto espontâneo foi assunto duas vezes. Primeiro, porque a cantora britânica Lily Allen perdeu o bebê. Depois, porque o ex-presidente dos EUA George Bush contou, na TV, um episódio de sua adolescência, quando a mãe lhe mostrou um pote com o feto que havia perdido.

Falar do assunto é o que menos acontece na vida de quem não é celebridade. Sociedade e medicina não dão suporte emocional para quem passou por aborto espontâneo, segundo organizações que trabalham com grávidas.

"Nas maternidades, essa mulher é tratada como se não tivesse acontecido nada de especial com ela. Fica apática por estar deprimida, e os profissionais dizem que ela "aceitou" a perda", diz a psicóloga Márcia Rodrigues.

Para sua tese de mestrado, Rodrigues acompanhou, entre 2007 e 2008, mulheres que tiveram filhos natimortos em hospitais de São Paulo. A conclusão da pesquisa é que a dor da perda é agravada pelo despreparo dos profissionais e pelo silêncio que as pessoas próximas impõem em relação à perda.

CHOQUE EMOCIONAL

"A maioria dos médicos só vê e fala dos aspectos técnicos. Mas essa mulher precisa de alguém que a ouça, porque o mais difícil é lidar com o choque emocional de alguém que estava esperando uma vida, não a morte", afirma Rodrigues.

Do ponto de vista médico, é esperado que até 20% das gestações acabem em aborto espontâneo nos três primeiros meses. A maioria dos casos é provocada por alterações nos cromossomos, que causam defeitos no feto.

"Para o médico, é como se fosse uma "seleção natural", pode fazer parte da rotina. Mas não podemos desvalorizar o que a mãe está sentindo, banalizando o evento", diz o ginecologista Newton Eduardo Busso, secretário-geral da Sogesp (Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo).

Marcia Rodrigues conta que, em sua pesquisa, os profissionais de saúde se mostraram despreparados para ajudar essa mulher. "Às vezes, não é preciso muito, só ouvir o que ela tem a dizer. Uma enfermeira bem formada pode fazer isso", afirma.

A psicóloga acredita que a formação de profissionais para o parto humanizado também ajuda a humanizar os procedimentos associados ao aborto espontâneo ou ao parto de natimortos.

DIGNIFICAR O LUTO

A escritora portuguesa Maria Manuela Pontes, autora de "Maternidade Interrompida" (ed. Ágora), afirma que a sociedade não dignifica o luto da mulher que sofreu aborto espontâneo.

"Perder um bebê no útero é um dos piores lutos que existem. Para elaborá-lo, a mulher precisa falar do que está sentindo e ser ouvida por todos ao seu redor."

Para o psicanalista Roosevelt Cassorla, autor de "Da Morte" (ed. Papirus), é exagero afirmar que a sociedade desqualifica a dor e o luto dessas mulheres.

"Talvez apenas não valorize tanto, porque ainda não era um ser nascido, e o aborto espontâneo faz parte das possibilidades da gestação. A consequência é que a mãe se sente só, e para elaborar um luto é necessário compartilhar com outras pessoas." 
 






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