Procurador tenta trazer para a Justiça de MT a ação popular para investigar superfaturamento no "Escândalo do Maquinário"
PGE quer que investigação fique no âmbito no Estado
A Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso é responsável, com exclusividade, pela Advocacia do Estado. Incumbe-se de representar o Estado em Juízo e prestar assessoria e consultoria jurídica ao Poder Executivo.
É uma instituição de natureza permanente, vinculada diretamente ao governador. Por este motivo, o procurador-geral do Estado, Dorgival Veras de Carvalho, está presente em praticamente todas as questões envolvendo a administração.
Nesta entrevista ao Diário, ele fala sobre a reforma administrativa promovida pelo governador Silval Barbosa (PMDB) que, segundo ele, será feita sem aumentar os encargos.
Dorgival conta sobre a posição do Estado no "Escândalo do Maquinário", que revelou superfaturamento de R$ 44 milhões na aquisição de 705 máquinas e caminhões que foram cedidos aos 141 municípios mato-grossenses. O procurador tenta trazer para a Justiça Estadual uma ação popular que está nas mãos do juiz Julier Sebastião da Silva, da 1ª Vara Federal.
Neste ano, o Estado já pagou R$ 100 milhões de precatórios e estima pagar outros R$ 150 milhões no próximo ano. O montante, conforme defende Dorgival Veras, coloca o Estado em posição de vanguarda no cumprimento de decisões judiciais.
O procurador-geral fala ainda de uma disputa judicial que pode resultar na incorporação de uma área de 2,2 milhões de hectares a Mato Grosso e do concurso para procurador do Estado, que deve acontecer em 2011.
Diário de Cuiabá - Na reforma administrativa do governo, a Procuradoria Geral do Estado terá novas atribuições. Quais serão elas?
Dorgival Veras - Ela continua com as mesmas atribuições, apenas se deslocou para outro ponto na estrutura. Mas ela continua com sua atribuição de representar judicialmente o Estado e promover a consultoria jurídica. A PGE funciona como órgão central do sistema jurídico estadual, supervisiona os serviços jurídicos da administração direta e indireta no concernente às autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, trabalho no controle interno da legalidade dos atos da administração pública e exerce a defesa dos interesses legítimos do Estado.
Diário - O senhor participou da elaboração da reforma administrativa no governo Silval Barbosa. Em que ela consiste e quais serão os benefícios de sua aplicação?
Dorgival - O governo ampliou as atividades administrativas, dividiu algumas secretarias, mas sem aumentar encargos ou pessoal. A mudança é para que o Estado seja mais operante. Por exemplo, ele criou a secretaria das Cidades. Aquelas atribuições que envolviam as cidades e estavam deslocadas estarão concentradas no órgão. As atribuições estão sendo demarcadas. Uma reforma moderna, sem aumentar despesa.
Diário - O senhor também participou da reestruturação da Agecopa. Isso traz alguma mudança prática?
Dorgival - Foi apenas uma reestruturação para definição de atribuições. A estrutura é a mesma da lei inicial que delegou a função de agência executiva dos programas da Copa.
Diário - Em que fase está o processo que pode resultar na incorporação de uma faixa territorial a Mato Grosso, localizada na divisa com o Pará?
Dorgival - É uma ação civil originária que, quando eu estava em Brasília, chegou um estudo do marechal Cândido Rondon no qual ele insurgiu do mapa político-geográfico do Brasil feito em 1922 pelo antigo clube de engenharia do Rio de Janeiro, atual IBGE. Em 1956, Rondon foi até o local e discordou da divisa norte de Mato Grosso. Ele fez novos estudos, um novo mapa, com base na documentação histórica aprovada pelo Pará e Mato Grosso, e achou que houve um equívoco nessa linha demarcatória. Existiam dois marcos geográficos chamados Cachoeira das Sete Quedas e Salto das Sete Quedas. Um mais ao norte, outro mais ao sul. O que fez o IBGE? Tomou como ponto de partida o acidente geográfico mais ao sul. Já no mapa do Rondon, a divisa fica mais ao norte, e ele conhecia ali como a palma da mão. Nós entramos com a ação no Supremo pedindo que ele dissesse qual a linha correta de demarcação. Pedimos também, liminarmente, que o STF proibisse a titulação de terras na região, para evitar confusão na área de 2,2 milhões de hectares, o equivalente ao estado de Sergipe. Foi concedida a liminar. De 2004 até agora o processo vem tramitando e quando foi em julho o Supremo determinou a perícia. Fui a Brasília e acordamos que a perícia será feita pela direção de serviço geográfico do Exército. Só estão esperando terminar o período de chuvas para dar início em março ou abril. Vão fazer uma perícia de campo com a participação de engenheiros e topógrafos. Ela será feita em três fases. A primeira consistirá na avaliação da legislação dos dois Estados. A segunda será a análise do estudo de Rondon. Por fim, irão fazer o relatório final.
Diário - Traz algum benefício incorporar essa área?
Dorgival - Lógico! São mais de dois milhões de hectares. Uma grande parte dessa área é habitada por pessoas que pertencem ao estado de Mato Grosso. A maior parte das pessoas que vive nessa divisa usa serviço de energia, saúde, cartorário, tudo de Mato Grosso. Com a incorporação, o Estado alarga sua fronteira. Até houve uma alegação de que o Estado estava tentando expandir sua fronteira para plantação de soja, mas a região não permite. Aliás, em 1956, quando foi feita a contestação por Rondon, não tinha soja em Mato Grosso. É uma região de transição entre o cerrado e a floresta amazônica. Não tem como produzir soja.
Diário - A divisão de Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul gerou uma série de ônus ao Estado, que seria compensada pela União. Nós já fomos indenizados?
Dorgival - A União ficou responsável de repassar para Mato Grosso um percentual para pagamento de funcionários aposentados. Durante 20 anos, isso não foi feito, muito embora o Estado tenha requerido. Quando a Procuradoria pegou essa documentação, começou a trabalhar esta questão. Nos últimos oito anos, a União começou a fazer os repasses. O Estado paga aposentados do Poder Executivo, Legislativo, Judiciário e do Ministério Público, e logicamente que tem que haver a cobertura. Isso faz parte da Lei Complementar 31 que dividiu Mato Grosso e o Mato Grosso do Sul. Nos últimos anos já recebemos R$ 100 milhões e temos mais R$ 60 milhões para receber. O alinhamento político entre governos do Estado e Federal fez com que o repasse se tornasse possível sem trauma, tudo dentro da legalidade.
Diário - Quanto o Estado pagou de precatórios neste ano e qual a previsão para 2011?
Dorgival - Até outubro, pagamos R$ 80 milhões com a previsão de chegar a R$ 100 milhões até dezembro. Para o próximo ano, a previsão é de R$ 150 milhões. No início desse governo, em 2006, existia um atraso no pagamento dos precatórios, principalmente aqueles trabalhistas. Hoje, Mato Grosso se prepara para se inserir num contexto de vanguarda, no tocante ao cumprimento das suas obrigações legais decorrentes de condenação judicial. Os precatórios originários de condenação judicial.
Diário - Existe algum mecanismo para impedir que esses precatórios sejam usados como moeda de troca?
Dorgival - Não tem como. Essa é a chamada lei de mercado. Alguém que tem um precatório que está na fila cronológica para o pagamento pode ceder o direito. Não há lei que proíba a cessão desse direito. Então, o que as pessoas fazem? Quem está na frente oferece a outro o recebimento. Mas essa é uma questão particular, ninguém pode colocar alguma objeção a esse direito, muito menos o Estado.
Diário - Por que o Estado tentou travar as investigações do "escândalo do maquinário" na Justiça Federal?
Dorgival - O Estado não recorreu ao TRF para barrar as investigações. Recorremos para colocar o trem nos trilhos. Entendemos que o foro competente para julgar uma ação popular que tramita na esfera federal é a Justiça estadual. Esse é o primeiro ponto que contestamos. Entendemos também que o ex-governador Blairo Maggi não deveria ser incluído no polo passivo da ação. Analisei todo o processo e não vi nada em relação ao ex-governador, absolutamente nada. A não ser o fato de ele ser ex-governador. Se valer essa tese, não existe governador isento de nada. Eles acabarão respondendo pelos atos de todo servidor. Então, recorremos pedindo a exclusão, que não foi aceita. Os advogados dele devem ter feito o mesmo. Havia um pedido de recolhimento de máquinas, um absurdo, uma aberração recolher 705 máquinas que estão nos 141 municípios de Mato Grosso. Não havia nenhuma razão plausível para trazer as máquinas para Cuiabá para serem periciadas. Achamos essa perícia desnecessária. O fundamento da ação popular é superfaturamento, que não está comprovado. Se for comprovado, aí, sim, deverão fazer uma perícia técnica, financeira e contábil sobre os valores para dizer o real preço da mercadoria comprada. Em princípio, não vimos esses indícios. Então, pra que perícia? Nós discordamos dessa perícia, mas apesar disso a Politec examinou o maquinário, as notas fiscais e o edital e detectou que as máquinas são as mesmas especificadas, que não existe modificação. Temos o laudo que irei oferecer ao juiz federal.
Diário - Além dessa, que medidas a PGE tomou em relação a este caso?
Dorgival - Também estamos discutindo a competência do juízo. Não houve nenhuma lesão ao patrimônio federal para o juiz tocar o caso. Uma eventual lesão seria ao estado de Mato Grosso, que fez o contrato com o Banco do Brasil com recursos do Finame, que é do BNDES. O próprio BNDES vai recorrer a Brasília dizendo que não tem interesse na ação contestando a citação no processo. Eventual problema no contrato seria entre o Banco do Brasil e o Estado. Entendemos que um juiz estadual deve conduzir esta ação popular.
Diário - O senhor foi nomeado pelo ex-governador Blairo Maggi. Existe alguma conversa entre o senhor e o governador Silval Barbosa para permanecer no cargo de procurador-geral?
Dorgival - Não! O cargo de procurador-geral do Estado é de confiança do governador. Tenho um compromisso com ele até 31 de dezembro. O governador pode escolher entre os procuradores alguém de confiança para estar ao lado dele. É um cargo de confiança, por isso não é escolhido de uma lista tríplice. Entendemos que cumprimos a nossa missão em relação a Blairo e Silval no que tange a alertar sobre eventuais erros, orientar e produzir defesas necessárias ao Estado. Cabe ao Silval a escolha.
Diário - Como está o quadro de procuradores no Estado? Existe alguma previsão para concurso?
Dorgival - Temos um quadro de 60 procuradores na ativa e uma previsão para concurso que já está autorizado pelo governador. Não foi possível lançá-lo neste ano por conta do ano político. Mas a estimativa é abrir 20 novas vagas em 2011.
Diário - O senhor é um servidor de carreira. Participou do governo de Blairo Maggi e Silval Barbosa. Qual a avaliação o senhor faz do governo que passou e a projeção para os próximos quatro anos?
Dorgival - Esse governo que vai continuar, mas com uma nova identidade, dará continuidade ao pensamento do ex-governador Blairo Maggi de reafirmação da PGE como órgão auxiliar das políticas públicas. Silval deu continuidade a esse pensamento e ainda incrementou nossas atribuições para participar da confecção de um Estado moderno. Eu me sinto realizado com esses dois governadores, independente de ficar ou não no cargo de procurador-geral do Estado. Quero continuar participando deste governo, que é um governo sério, que tem cumprido o artigo 37 da Constituição no quesito moralidade pública.
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