AGU: presidente tem direito de supor que Battisti é perseguido
O ministro-chefe da Advocacia-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, disse nesta quarta-feira não ver problemas no fato de a não-extradição do ex-ativista italiano Cesare Battisti, decidida em 31 de dezembro pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ser baseada na "suposição" de uma futura perseguição ao ex-militante na Itália. "O tratado (de extradição entre Brasil e Itália) admite o juízo de suposição. Eu posso supor determinada situação. Pode-se não concordar com a suposição do presidente de perseguição política, mas ele pode supor" disse o ministro.
Cotado para ocupar um assento no Supremo Tribunal Federal (STF) em substituição ao ministro Eros Grau, Adams não esboça preocupações com o fato de o partido Democratas (DEM) ter recorrido ao Supremo na tentativa de derrubar o parecer que serviu como parâmetro para Lula negar a extradição. Ele acredita que a grita dos oposicionistas sequer vai ser analisada a fundo pelos magistrados do STF ou, no jargão jurídico, que a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) proposta pelo DEM não chegará nem a ser conhecida pelo Supremo.
Em tese, antes de analisar se o parecer da AGU pró-Battisti afronta ou não a Constituição e o tratado de extradição firmado em 1989 entre Brasil e Itália, os ministros terão de verificar preliminarmente o cabimento da ADI e detectar se os argumentos expostos pelo advogado-geral vinculam o presidente a tomar decisões determinadas em processos de extradição em geral - como sustenta o DEM - ou se as alegações feitas pelo governo no caso Battisti são aplicadas exclusivamente neste processo.
Neste cenário, o governo da Itália precisaria da maioria absoluta dos ministros - seis de dez na atual composição - para que a decisão de Lula pró-Battisti fosse invalidada. O placar em favor de que a palavra final sobre a extradição coubesse ao presidente da República foi, na época do julgamento, exatamente de seis a quatro.
A controversa situação do italiano, que desperta interesses humanitários ao mesmo tempo que evoca protestos na Itália, é vista pelo ministro como natural e até previsível. Ele a compara, por exemplo, à decisão do governo da Suíça de não extraditar o cineasta franco-polonês Roman Polanski "por razões de interesse nacional", ainda que ele estivesse respondendo a um processo por crime de pedofilia - Polanski era acusado de ter estuprado uma menina de 13 anos em 1977.
"Situações como a extradição são muito controvertidas. (O caso Battisti) é um debate altamente complexo, mas é uma decisão", afirmou. Para ele, o retorno do caso Battisti ao Supremo - mesmo com a decisão do ex-presidente Lula de não extraditá-lo - reflete a discussão ora imposta sobre a quem cabe a palavra final sobre uma extradição, se ao Poder Executivo ou se à Justiça.
"Esse impasse é absolutamente natural e vai além da situação do Battisti. Faz muito mais sentido manter (a palavra final com) o Executivo. Juízos humanitários e soluções humanitárias são negociados pelos Estados, e o Judiciário não vai fazer, não tem meios de fazer juízo de situações agravantes (antes de decidir sobre uma extradição)", afirmou.
DEM
O Democratas encaminhou nesta quarta ao Supremo recurso em que busca anular o parecer da AGU em favor de Battisti. Em sua argumentação, o partido oposicionista observa que cabe ao STF julgar a extradição solicitada pelo governo da Itália e à própria Corte analisar a incidência de eventuais impedimentos constitucionais ou convencionais à entrega de Battisti a seu país de origem. Por essa perspectiva, defende o DEM, caberia ao Supremo verificar se a definição do crime político poderia ser aplicada à situação de Battisti e, se fosse o caso, barrar a extradição.
O Democratas sustenta ainda que a figura do presidente da República não pode ter amplo poder para supor um eventual agravamento da situação de Battisti caso volte à Itália. A tese de fundado temor de perseguição foi utilizada para o então ministro da Justiça, Tarso Genro, para a concessão de refúgio político ao italiano e pela própria advocacia-geral para embasar a não-extradição.
Ex-integrante de organizações de extrema-esquerda, Battisti foi condenado à revelia pela Justiça de seu país à prisão perpétua por quatro assassinatos, ocorridos no final da década de 1970. Depois de preso, Battisti, considerado um terrorista pelo governo italiano, fugiu e se refugiou na França e na América Latina. Ele está preso na penitenciária da Papuda, em Brasília, desde 2007.
Comentários