O biólogo Fernando Krynski, de 47 anos, perdeu grande parte do movimento das pernas após um erro médico há 15 anos. A vida na cadeira de rodas o fez deixar o trabalho de campo em sua área. Após anos fazendo reabilitação em centros de fisioterapia, ele resolveu experimentar a academia. “Na época eu achei que não ia dar para treinar. Antes da cirurgia nem fazia exercício, não gostava de academia, mas era muito ativo no trabalho. Depois, achei que faltava algo, alguma atividade.”
A escolhida pelo biólogo foi a Fórmula Academia, que tem sua unidade no Shopping Eldorado, na Zona Oeste da capital paulista, toda adaptada. “Quando entrei vi que tinha adaptação, elevador, os professores sabiam lidar com o aluno na cadeira de rodas”, conta ele, que chegou a nadar para competir, mas parou depois de desmaiar na piscina devido a um pico de pressão alta.
Hoje, faz musculação de três a quatro vezes por semana. Em algumas máquinas ele consegue fazer os exercícios sem deixar sua cadeira. Em outros, precisa se sentar no aparelho, o que não é um problema. “Mas preciso da ajuda do professor. Às vezes a máquina é com cabos, tem que puxar, e eu não tenho altura. Às vezes precisa apoiar as coisas, e não tenho um bom equilíbrio do tronco”, afirma Krynski.
Por isso, a academia conta com um ou dois professores por turno direcionados a atender os alunos com limitações. A grande maioria dos equipamentos é adaptada e conta com cintos, por exemplo. Para os exercícios aeróbicos, há uma “bicicleta” para as mãos na qual o cadeirante não precisa sair de sua cadeira de rodas.
Lina e Sônia fazem natação e dança na academia,
respectivamente (Foto: Juliana Cardilli/G1)
“O professor acaba ficando de personal para o cadeirante. Ele precisa de atenção especial, e também trabalhamos a socialização. Na maioria dos exercícios nós temos que estar junto com ele”, diz a professora Daniela Gaudêncio. “Conseguimos adaptar os exercícios para trabalhar todos os grupos musculares. Além do aspecto funcional, dá para trabalhar a estética também.”
Estética e socialização
Além de fazer um trabalho específico para cada pessoa, verificando quais as suas limitações e a partir daí definindo os exercícios, as academias também trabalham com a socialização dos alunos. “O trabalho é direcionado com a proposta de, através dos exercícios, melhorar suas funções para as atividades da vida diária. Os exercícios são voltados para o fortalecimento, amenizar as assimetrias e integrá-los no meio ambiente da academia com a missão de fazer amigos e estarem bem fisicamente”, afirma Wilmar dos Santos Villas, da Cia Athletica, que cita a criatividade e o bom senso como armas dos professores.
Utilizando a cadeira de rodas desde a infância, a dançarina Sônia Maria Souza Alvim Crespo, de 50 anos, é muito popular na Fórmula. Em um grupo de dança para cadeirantes há dez anos, ela prega a terapia do movimento. “Você pode fazer movimentos através da dança, mesmo na cadeira você pode se soltar”, conta ela, que também faz musculação e alongamento. “Aproveito bastante o movimento dos braços, os pesos. Os professores também fazem movimentos com as minhas pernas, trabalham a musculatura.”
Sua colega Lina de Souza, de 42 anos, que perdeu o braço e a perna esquerdos em um acidente de trem quando tinha 16 anos, faz natação e compete. “Comecei a fazer exercícios há 12 anos. Eu nem queria, fui obrigada. Me mandaram para a natação, fiquei morrendo de vergonha, mas vi pessoas com situação pior que a minha. Nadar mudou a minha vida. Antes eu não fazia nada. Agora eu viajo, conheço pessoas, mudei minha cabeça”, conta ela.
Alex é maratonista e também dá aulas de dança
(Foto: Juliana Cardilli/G1)
Competição
O maratonista e professor de dança Alex de Souza, de 35 anos, já venceu diversas meias maratonas em sua categoria e está em período de treinamento para a próxima prova. Com uma prótese em formato de lâmina na perna direita, ele corre nas esteiras da academia sem parecer fazer muito esforço. Usando próteses desde os 3 anos, ele afirma que fazer os exercícios é um aprendizado constante. “Às vezes um exercício não dá certo, é tudo uma adaptação. A maior parte eu consigo fazer tranquilo, tem um ou outro que preciso adaptar, o professor dá as dicas. A academia é toda adaptada, isso facilita”, conta.
Todos eles, entretanto, concordam que fazer exercícios é fundamental. “Tanto para a cabeça quanto para a saúde física. Hoje a academia é o que me preenche. Meus braços são agora minhas pernas, uso o dia inteiro, a todo momento, tenho que fazer exercícios. E é diferente treinar dentro de um shopping, com gente bonita. Só de estar em um ambiente que não é um hospital já é um grande passo”, diz o biólogo Krynski.
Parque da Juventude
Quem não tem dinheiro para pagar uma academia mas quer fazer exercícios na cadeira de rodas pode utilizar os aparelhos adaptados instalados no Parque da Juventude, na Zona Norte de São Paulo, desde maio de 2010. São três conjuntos de equipamentos com atividades que podem ser feitas pelos cadeirantes – placas ao lado de cada um deles explicam como eles devem ser usados.
“Dá para a pessoa usar sozinha, são muito fáceis, muito simples, bem práticos, não é nada complicado. Está tendo um certo uso, não é tão grande, mais aos finais de semana. Mas o comentário que eles [os usuários] fazem é muito positivo. É difícil eles encontrarem esses equipamentos em outro local”, conta Paulo Pavan, diretor do parque.
Por enquanto, não há profissionais especializados para dar suporte. Os equipamentos estão instalados próximos à entrada da Avenida Cruzeiro do Sul, 2.630, ao lado da Estação Carandiru do Metrô. O parque é todo acessível e a área onde estão os aparelhos fica aberta das 6h às 18h30 – durante o horário de verão, o fechamento ocorre às 19h30.
Parque da Juventude tem aparelhos adaptados para cadeirantes (Foto: Divulgação)
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