Após um ano de investigação da Polícia Federal, escutas telefônicas mostram que em vários momentos o inspetor da Polícia Civil Christiano Fernandes, preso pela PF na Operação Guilhotina, falou com o ex-chefe de polícia Allan Turnowski. Até agora trinta policiais foram presos na Operação Guilhotina.
Em uma das ligações Christiano ligou para Turnowski para falar que prendeu traficantes e que eles confessaram que os chefes do tráfico ordenaram ações terroristas pela cidade.
Allan Turnowski – Vamos agir, vamos agir que é hora da gente provar nosso valor aí. Mostrar que o que a gente fez durante anos era o correto. E apesar de tentarem destruir o que a gente fez. Agora a gente está sendo colocado a prova aí. Tem muita coisa destruída, nossos canais de informação, nossos contatos, mas é hora de refazer. Senão a gente não segura isso não.
Christiano Fernandes – Deixa comigo.
Numa outra ligação, Turnowski pede empenho de Christiano para fazer apreensões.
Allan Turnowski – Hoje é dia de apreensão, parceiro. Temos que pegar alguma coisa. Bota sua galera firme, eu sei que vocês não têm essa de sujar a mão então cai dentro. A gente precisa de apreensões hoje.
Christiano Fernandes – Deixa comigo, pô. Deixa comigo. Eu entro lá e arrebento.
Allan Turnowski – Cai pra dentro lá porque a gente precisa de arma, de droga, de vagabundo. Se não tiver vagabundo, arma e droga. A gente precisa disso hoje aí.
Num terceiro telefonema, o ex-chefe de polícia liga para Christiano para saber a situação de um bandido preso. Nesta ligação, ele cita escutas da Polícia Federal.
Allan Turnowski – O secretário me ligou que caiu na escuta da Federal a prisão desse cara por um pessoal da 22ª DP. Por isso que eu estou te ligando. Entendeu?
Christiano Fernandes – Entendi. Está lá na 22ª DP. Tá lá trancado já.
Allan Turnowski – Então tá, então olha só: fica esperto aí porque nego na Federal está dizendo que caiu na escuta, que nego ia vender uma cabeça aí, não sei o que. Ainda bem que eu já tinha sido ouvido e já tinha falado com o secretário. Senão nego já tinha queimado vocês aí. Então fica esperto, vê se não tem ninguém mais agarrado. Vê isso certinho aí. Confere as suas equipes aí.
Christiano Fernandes – Não, não tem não. Sou eu que estou na rua, sou eu que estou rodando. Não tem não.
A Polícia Federal indiciou Allan Turnowski por quebra de sigilo funcional baseado na gravação deste último diálogo.
De acordo com o relatório da PF, Turnowski teria divulgado para Christiano Fernandes a existência da operação da Polícia Federal que visava reprimir crimes praticados por policiais estaduais.
Segundo a polícia, Allan Turnowski está fora do país. Na semana passada, o ex-chefe de polícia negou que soubesse da operação da Polícia Federal e garantiu que é inocente. Ele alegou que ligou para Christiano a pedido do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, para saber a situação de um preso.
Beltrame já prestou depoimento na Polícia Federal e confirmou que falou com Turnowski, mas disse que em nenhum momento citou a Operação Guilhotina.
Além de Allan Turnowski, a Polícia Federal indiciou também a delegada Márcia Becker, por prevaricação. No dia da Operação Guilhotina, o inspetor Christiano Fernandes ligou para ela para avisar sobre a operação. De acordo com a PF, Christiano pediu que a delegada dissesse que ele estava de férias. Ela teria concordado.
Agora, com o relatório da PF entregue à Justiça, o Ministério Público tem até 15 dias para decidir se denuncia ou não os delegados Allan Turnowski e Márcia Becker.
A operação
No dia 11 de fevereiro, a PF iniciou no Rio uma megaoperação para prender policiais civis e militares suspeitos de ter ligação com traficantes, milícias e máfia dos caça-níqueis.
Na ocasião, Márcia Becker foi conduzida à sede da PF. Ela era titular da 22ª DP durante as ações na Vila Cruzeiro e no Alemão, em novembro do ano passado, e já esteve à frente da Delegacia de Repressão a Armas e Entorpecentes (Drae) e da 17ª DP (São Cristóvão). No início da ação, agentes vasculharam armários das delegacias da Penha e de São Cristóvão. De acordo com a Secretaria de Segurança, os agentes procuraram, sobretudo, materiais que poderiam reforçar as acusações contra os suspeitos.
Com os desdobramentos da ação, o ex-chefe da Polícia Civil do Rio, Allan Turnowski, acabou deixando o cargo e foi indiciado pela PF.
A Operação Guilhotina prendeu 38 pessoas, das quais 30 são policiais militares ou civis, incluindo o delegado Carlos Oliveira, ex-subchefe operacional da Polícia Civil. A ação também apreendeu farta quantidade de munição, um fuzil, três pistolas e uniformes de grupos especiais da polícia (Core e Bope), além de grande quantidade de dinheiro.
TJ aceita denúnica de MP
Na semana passada, Tribunal de Justiça (TJ-RJ) confirmou, através de sua assessoria, que aceitou a denúncia do Ministério Público contra 43 investigados - a maioria policiais civis e militares - na Operação Guilhotina.
Com o recebimento da denúncia pela Justiça, foi iniciado o processo penal contra os réus acusados dos crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e ativa, peculato e violação de sigilo funcional e outros delitos. A denúncia do MP foi feita ao Juízo da 32ª Vara Criminal da Comarca do Rio.
De acordo com a denúncia, os acusados atuavam em delegacias ou em posições estratégicas da Segurança Pública. Os policiais "formavam quatro grupos criminosos que atuavam independentemente utilizando-se das facilidades proporcionadas pelos cargos que exerciam".
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