O médico Maurélio Ribeiro afirma ter deixado a Secretaria de Saúde de Cuiabá principalmente por causa da decisão do prefeito Chico Galindo (PTB) em centralizar decisões da pasta, assim como de todo o staff da Capital. Em entrevista ao jornal A Gazeta, diz ainda que a terceirização de serviços do setor através das chamadas Organizações Sociais (OS) é um debate que terá que ser feito pela sociedade.
Maurélio deixou o cargo oficialmente nessa sexta-feira (25) depois de 3 pedidos de demissão que vinham sendo adiados por Galindo. No comando da pasta assumiu o também médico Antônio Pires Barbosa.
Ao deixar a cadeira, Maurélio mandou o recado: toma que o filho é teu!. A frase dirigida a Antônio Pires é sintomática, mas o ex-secretário garante que continuará ajudando o prefeito. A entrevista foi concedida na quinta-feira (24), no gabinete do então secretário.
Filho do presidente estadual do DEM, Oscar Ribeiro, Maurélio diz que os principais avanços que conduziu foram: redução de 67% dos casos de dengue em 2010; reestruturação das equipes de planejamento familiar; aprovação dos projetos para criação de 2 unidades de pronto atendimento (UPAs) e implantação do consultório de rua.
A Gazeta - Por que o senhor pediu demissão?
Maurélio Ribeiro - Quando assumimos a Secretaria de Saúde há 15 meses, tivemos a garantia de que teríamos liberdade. A gente vem desenvolvendo muitas ações aqui e que, na minha opinião, vieram a melhorar bastante os problemas que encontramos pela frente. Se não conseguimos resolver o caos, pelo menos conseguimos dar uma cara e organização aqui.Gazeta - Mas aconteceu algum problema para azedar essa relação com o prefeito, não é?Maurélio - Agora em 2011, a prefeitura de Cuiabá decidiu mudar o modo de gestão não só em relação à Secretaria Municipal de Saúde, mas com todas as pastas de um modo geral. O prefeito determinou uma nova metodologia administrativa que, na minha opinião, não é factível na Saúde. Tudo agora tem que passar pela prefeitura antes de ser colocado em prática. Fiz essa exposição ao prefeito de que é algo burocrático demais, mas me parece que ele acredita e muito nas suas ideias. Então, eu tenho que deixá-lo à vontade para que possa encontrar um profissional que se encaixe nesse perfil e seja melhor sucedido que eu.Gazeta - Como o prefeito recebeu essa decisão?Maurélio - Veja bem, essa determinação do prefeito é centralizadora e as ações do SUS exigem rapidez. Não vejo como isso pode ocorrer na prática. Basta dizer que, nos últimos 2 meses, enfrentamos alguns problemas e retrocessos. Temos gasto nosso prestígio e boa relação conquistada para dar andamento e para que os avanços conquistados não se percam. Então, esse é o grande motivo da nossa saída.Gazeta - O senhor é o sétimo secretário desde a gestão do ex-prefeito Wilson Santos. Por que tantas mudanças? Isso não é ruim para o setor?Maurélio - Sim. Acredito que é extremamente prejudicial. A saúde e o SUS são projetos de longo prazo. Infelizmente, essas trocas constantes brecam todo o processo e interferem na evolução. Isso não é salutar e nem de bom tom. Infelizmente, a saúde hoje é uma das que mais estão presentes na mídia. Mas, quando se quer alcançar objetivos de cunho político, as pessoas mexem nesse setor. Não podemos ser reféns de aventuras administrativas. Não estou dizendo que seja esse o caso do prefeito, mas temos obrigação de proteger o processo que envolve tantas pessoas. Não existe uma pessoa no país que não seja abrangida pelo Sistema Único de Saúde, seja através de vacinas, planejamento sanitário, entre outros. Isso é diferente de outras pastas.Gazeta - Então, na opinião do senhor, é a política que leva a esse triste quadro da Saúde?Maurélio - Não digo a questão político-partidária. É a gestão central mesmo. O jogo político é parte do processo. Os cargos de secretários estão sujeitos a manobras, entendimentos políticos e coligações. Não tenho nada contra isso e entendo as regras do jogo, mas temos questões delicadas que não podem parar.Gazeta - O senhor sai levando junto toda a direção da Secretaria de Saúde?Maurélio - Não foi nessa orientação. Não estamos deixando o cargo por desentendimento com a prefeitura. O prefeito tem o nosso respeito e consideração e a população também. Estou deixando a cadeira por uma análise técnica e pessoal. Chegamos à conclusão de que não podemos tocar a Secretaria dessa forma. Pelo menos nós não temos a competência para isso. Então, vamos torcer que alguém faça isso melhor do que poderíamos fazer.Maurélio - É lógico que o quadro se agravou pela grande demanda vinda do interior e até da Bolívia. Cuiabá não está estruturada para atender toda essa demanda. Continua grave a situação? Sim, pois não surgiram leitos novos na nossa cidade, nem em Várzea Grande ou mesmo no Estado. O ex-secretário estadual Augustinho Moro iniciou a aproximação, que vem sendo levada adiante pelo deputado federal Pedro Henry (PP). O Estado começou a entender que, se Cuiabá não estiver bem, Mato Grosso não estará também. O governador Silval Barbosa (PMDB) endossou essa aproximação e os recursos estaduais estão chegando aos cofres do município.Gazeta - Por falar nisso, o senhor é a favor de terceirizar serviços da saúde através das chamadas Organizações Sociais (OS)?Maurélio - A gente tem aqui em Mato Grosso um certo ranço e medo em função do que já ocorreu com essas Organizações Sociais e Oscips (Organizações Sociais de Interesse Público). Duas delas, Idheas e Creatio, são acusadas na operação Hygeia de operar desvios de R$ 50 milhões da Funasa. O que acho que falta é todo mundo sentar à mesa para discutir numa negociação franca e aberta, respeitando as categorias. Os profissionais da saúde estão bastante organizados. Não recebem nada mais goela abaixo. Temos que convencê-los de que as propostas são boas.Gazeta - Particularmente, o senhor é a favor ou contra essa terceirização?Maurélio - Particularmente, não sou nem contra e nem a favor. Acredito que pode ser uma boa opção, desde que devidamente conversado. O jogo tem que ser esclarecido. Os profissionais têm que saber para quem estão prestando serviço, quais as condições de trabalho e mecanismos de fiscalização. O Estado também tem que estar presente cobrando dessas organizações que prestem um trabalho sério. O que falta é conversa.
Gazeta - Uma grande reclamação do prefeito era de que o Estado deveria ajudar mais Cuiabá na área de saúde. Isso mudou?
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