Campo de tortura descoberto em região de diamantes no Zimbábue
Um programa da BBC descobriu a existência de um campo de tortura na região de Marange, rica em minas de diamantes, no Zimbábue.
O governo do Zimbábue foi procurado pela BBC mas não deu resposta oficial às denúncias.
As informações foram divulgadas em um momento em que a União Europeia tenta liberar parte da exportação de diamantes vindos do Zimbábue. A comercialização das pedras do país está sob embargo.
Em documento interno do bloco, ao qual a BBC teve acesso, a União Europeia diz que duas minas na área passaram a obedecer os padrões internacionais, e quer que os diamantes destas áreas sejam aprovados imediatamente para exportação - o que suspenderia parcialmente um embargo imposto em 2009.
O embargo passou a vigorar por determinação do chamado KP (Kimberley Process), organização internacional que fiscaliza o comércio de diamantes. O órgão denunciou assassinatos e abuso por parte das forças de seguranças do Zimbábue nos campos de diamantes de Marange.
O KP foi criado pela indústria de diamantes, governos de vários países e organizações não governamentais para evitar a entrada no mercado de diamantes vindos de áreas de conflito.
CHICOTADAS
Testemunhas afirmam que os campos de tortura estão em atividade há, pelo menos, três anos.
Em Marange, polícia e militares recrutam civis para procurar diamantes de forma ilegal, e trabalhadores que exigem uma fatia maior dos lucros são levados para os campos de tortura. Civis flagrados procurando diamantes por conta própria também são levados para os campos.
O principal campo descoberto pela reportagem é conhecido na região como "Base Diamante".
Segundo testemunhas, o campo fica em uma área afastada. Ele é formado por barracas militares em uma área sem cobertura, cercada por arame farpado, onde prisioneiros eram mantidos.
Este campo fica perto de uma área conhecida como Zengeni, em Marange -- uma das mais importantes áreas de exploração de diamantes do mundo. O campo fica a cerca de 1,6 quilômetro da mina Mbada, que produz diamantes que a União Europeia quer aprovar para exportações.
A companhia responsável pela mina é chefiada por um amigo pessoal do presidente do Zimbábue, Robert Mugabe.
"É um local de tortura onde algumas vezes os mineiros não conseguem andar por causa dos espancamentos", disse à BBC uma das vítimas, libertada do campo principal em fevereiro.
"Eles nos davam 40 chicotadas pela manhã, 40 à tarde e 40 à noite", disse o homem, que ainda não conseguia usar um dos braços por causa dos espancamentos, e mal conseguia andar.
"Eles usaram pedaços de madeira para me bater embaixo dos meus pés, enquanto eu estava no chão. Eles também acertaram meus tornozelos com pedras."
Ele e outros homens foram mantidos como prisioneiros no campo por vários dias antes da chegada de outros prisioneiros. Mulheres eram liberadas mais rapidamente, frequentemente depois de estupros, segundo testemunhas.
Todos os prisioneiros destes campos conversaram com a reportagem da BBC sem se identificar.
Um ex-integrante de uma unidade paramilitar da polícia que trabalhou no campo principal, em 2008, disse à BBC que torturou prisioneiros e também usou cães, que eram estimulados a atacar os detidos no local.
"Eles algemavam o prisioneiro e soltavam o cachorro, para mordê-lo", contou.
O homem, que também falou à BBC sem se identificar, contou ainda que uma mulher foi mordida no seio pelos cães enquanto trabalhava no acampamento. "Não acho que ela sobreviveu", disse.
PROIBIÇÃO
O KP havia pedido à polícia do Zimbábue para garantir a segurança da área, mas testemunhas disseram à BBC que a polícia e os militares do país é quem gerenciam os campos de tortura.
Nick Westcott, um porta-voz do grupo de trabalho em monitoramento do KP, disse que a descoberta dos campos "é algo que não foi relatado ao Processo Kimberley".
Em junho, o presidente do KP, Matieu Yamba, anunciou formalmente que a proibição da exportação de diamantes de duas minas importantes de Marange tinha sido suspensa, uma decisão que a União Europeia não aceitou.
Agora a União Europeia lançou uma proposta que visa acabar com o impasse. A proposta concorda parcialmente com a suspensão da proibição, mas insiste que o monitoramento internacional deve continuar em toda a região de Marange.
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