Atendentes que prestam serviço terceirizado para grandes empresas de telefonia contaram técnicas que, segundo eles, são usadas para tentar enganar o cliente e seriam ensinadas pelos próprios chefes. Os depoimentos exclusivos foram exibidos em reportagem do Bom Dia Minas nesta quinta-feira (6). Por vezes, o atendente parece ser o vilão nos atendimentos, mas os relatos denunciam que algumas atitudes são tomadas para cumprir metas estabelecidas pela prórpia empresa.
Um homem que trabalha em uma operadora de telefonia móvel contou como é orientado a agir quando um cliente liga querendo cancelar um serviço. Segundo ele, a meta é não deixar o cliente sair da operadora. Para isso, a cada ligação, é preciso enrolar para que o contratante não consiga concluir o cancelamento.
“Na hora que o cliente tá muito irritado, porque eles obrigam a gente fazer isso com o cliente, aí a gente pega e transfere o cliente pra outro setor, passa o número de protocolo errado. As vezes, até chega ao ponto de desligar o cliente”, explica o atendente de telemarketing. O funcionário disse que pode levar advertência e ter três dias descontados no salário, caso o cliente consiga efetuar o cancelamento.
Um telemarketing de outra empresa de telefonia revelou as estratégias que são ensinadas aos atendentes para tentar segurar os clientes. De acordo com ele, no treinamento é ensinado que quanto mais difícil a linguagem usada com o cliente, mais chances de retê-lo. Pelo fato de não entender a linguagem, da área de marketing, o cliente acaba desligando o telefone e desistindo de cancelar o plano, explica o funcionário.
A estudante Carolina Machado Leite, cliente de um operadora, relata que mudaram o plano dela sem ela saber. E ao chegar a fatura, ficou surpresa com o valor a pagar. Segundo ela, foi preciso recorrer ao serviço de proteção do consumidor. “No Procon, resolveu na mesma hora. Na mesma hora, foi emitida uma fatura pra mim no valor normal que deveria ter vindo”, afirma.
O atendente de telemarketing explica casos parecidos com o da estudante. Segundo ele, muitas vezes, planos são ativados assim que os clientes confirmam os dados. “Às vezes, o cliente nem tem noção do que ele tá pagando, certo? Às vezes ele tá recebendo um produto na casa dele sem ele conhecer”.
Campeão de reclamações
Segundo o Sistema Nacional de Informação de Defesa do Consumidor, o serviço de atendimento por telefone das empresas de celular é o segmento campeão de reclamações nos Procons de todo o país. No Procon de Belo Horizonte, o total de reclamações contra os chamados Serviços de Atendimento ao Consumidor (Sacs) foi de 1.350, até o fim de agosto deste ano.
O administrador de empresa Eduardo Miranda reclama do serviço oferecido por meio do 0800. De acordo com ele, a intenção ao realizar a ligação é resolver um problema, mas ao fim acaba tendo outro. “Eles vão transferindo a ligação para várias pessoas e isso se repete várias vezes, e o problema não é solucionado”, reitera. “Eles precisam mais de treinamento e sensibilidade, eu acredito”, completa o administrador.
O secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações e Telemarketing (Sinttel), Tiago Cassiano, confirma que os funcionários são pressionados dentro das empresas para conseguir atingir as metas. Ele fala como essas exigências podem trazer consequências negativas para o operador. “Nós temos hoje jovens com depressão, com estresse. É jovem que tem no seu dia-a-dia medicamentos de tarja preta jovens fazendo tratamento”, critica.
De acordo com Cassiano, muitas vezes, essas doenças não são reconhecidas como ocupacionais por causa da pouca idade do funcionário e por se tratar de uma doença que não é visível e, sim, psíquica.
Direito do consumidor
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) informou que, as práticas utilizadas pelos operadores, como falar difícil ou acionar planos sem a autorização dos clientes, são abusivas, proibidas pela legislação que regula a operação de telemarketing. O vice-presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB, Bruno Burgarelli, explica que informações falsas podem gerar multas às empresas e o pagamento de danos morais e materiais ao consumidor.
“É fundamental que o consumidor tenha o maior número de dados em relação ao que foi fechado no telemarketing. Cópia do contrato por escrito, seja informações sobre o que foi passada pelo operador de telemarketing, o número de protocolo, o dia do atendimento, o horário do atendimento. Essas informações podem ser muito úteis numa eventual discussão judicial ou extra-judicial”, afirma Burgarelli.
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