Cigarro intensifica vício em cocaína, diz estudo
Num experimento com camundongos, cientistas encontraram pela primeira vez evidência biológica de que o cigarro serve de "porta de entrada" para outra droga.
Ao dar água com nicotina aos roedores, pesquisadores da Universidade Columbia, de Nova York, mostraram que o vício subsequente em cocaína ficava mais intenso.
"É claro que fumar cigarros não determina se alguém vai ou não experimentar cocaína. Isso não é um fenômeno biológico, e sim social" disse à Folha, Amir Levine, autor principal do trabalho.
"A maioria dos fumantes nunca chega a experimentar cocaína. Entretanto, se você se tornar um fumante crônico e só depois for exposto à cocaína, seu cérebro vai reagir de forma diferente, sim." No teste com camundongos, Levine verificou que os animais submetidos a uso crônico de nicotina eram mais propensos ao vício.
Editoria de Arte / Folhapress | ||
NO CÉREBRO
A nicotina, afirma ele, interfere na regulação do DNA das pessoas e acaba por aumentar a expressão de um gene chamado FosB, que já havia sido relacionado a propensão ao vício. Em estudo na revista "Science Translational Medicine", Levine já aponta um medicamento que pode reduzir esse efeito.
"Mostramos que a teofilina -um broncodilatador usado para tratar asma- bloqueia o efeito da cocaína em termos de expressão do FosB", diz o cientista, que contou com a orientação de Eric Kandel, ganhador do prêmio Nobel de Medicina de 2000. Segundo o pesquisador, a possibilidade de uso da teofilina para dependência ainda precisa ser investigada.
O estudo levanta o questionamento sobre se, em centros de reabilitação, deve haver uma política de tolerância com cigarros. Como é difícil largar dois vícios ao mesmo tempo, muitos pacientes continuam fumando enquanto lutam contra a cocaína. Para tentar verificar a correspondência em humanos, Levine, com a ajuda da sanitarista Denise Kandel, mulher de Eric, analisou dados sobre consumo de drogas nos EUA.
A porcentagem de pessoas que experimentavam cocaína e se viciavam era grande entre fumantes: 20%. Entre aqueles que nunca tinham fumado, era de apenas 6%. É um motivo a mais para que o combate ao cigarro seja uma prioridade de saúde pública, diz a pesquisadora.
Denise, que apresentou seus resultados ontem no Congresso Brasileiro de Psiquiatria no Rio de Janeiro, sugere que as investigações continuem. "Será que o álcool e a maconha --as outras duas drogas que mais atuam como "porta de entrada"-- também preparam o cérebro da mesma forma que a nicotina?", perguntou a cientista, em comunicado à imprensa.
Comentários