Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), enviado à Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em fevereiro de 2011, revelou que foram identificadas movimentações financeiras "atípicas" de R$ 855,7 milhões de 3.426 juízes e servidores do Poder Judiciário entre 2000 e 2010.
O documento enviado pelo Coaf (órgão de inteligência financeira do Ministério da Fazenda) à corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, ao qual o G1 teve acesso, não indicou nomes ou CPFs individualmente - somente mencionou o volume e a natureza das chamadas movimentações atípicas dentre os magistrados e servidores sujeitos à fiscalização do Conselho Nacional de Justiça.
Segundo o relatório do Coaf, as movimentações consideradas atípicas foram realizadas por meio de depósitos, saques, pedidos de provisionamento, emissão de cheques administrativos e transferências bancárias.
De acordo com o documento, "as pessoas relacionadas receberam depósitos em espécie, em suas respectivas contas, de cerca de R$ 77,1 milhões e efetuaram, em contas de terceiros, depósitos, também em espécie, da ordem de R$ 29,7 milhões".
Segundo o Coaf, as movimentações atípicas concentram-se em tribunais dos estados de São Paulo (R$ 169,7 milhões), Rio de Janeiro (R$ 149,3 milhões) e Bahia (R$ 145,4 milhões).
CNJ pediu relatório
O relatório do Coaf aparece em documento protocolado nesta quinta-feira (12) pela ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça, no Supremo Tribunal Federal (STF).
No documento, ela apresenta argumentos para justificar as investigações, pelo CNJ, de magistrados e tribunais de vários estados.
Ela apresentou o documento porque, no último dia 19 de dezembro, uma liminar (decisão provisória) do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, suspendeu as investigações em 22 tribunais.
A liminar foi concedida em mandado de segurança ajuizado por três entidades - Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
No documento que enviou ao STF, Eliana Calmon informa que, em julho de 2009, o então corregedor nacional de Justiça, Gilson Dipp, decidiu - diante de suspeitas de desvios funcionais - instaurar procedimento administrativo para obter uma lista atualizada com nome e CPF de todos os membros e servidores dos tribunais estaduais, federais, trabalhistas e militares - à exceção dos integrantes do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores (fora da área de competência do CNJ).
Um ano depois, em julho de 2010, segundo relata Eliana Calmon, Dipp enviou para o Coaf os dados de 216,8 mil magistrados e servidores que recebeu dos tribunais, a fim de que fossem identificadas eventuais movimentações financeiras "atípicas".
Corregedora nega "devassa"
"Não foi solicitada qualquer investigação e muito menos devassa sobre magistrados e servidores. Indagou-se apenas se havia registro de operações atípicas", diz no texto Eliana Calmon. De acordo com a corregedora, a resposta do Coaf chegou em fevereiro de 2011, quando ela já comandava o CNJ, como sucessora de Gilson Dipp.
Segundo o texto de Eliana Calmon, o regimento interno do CNJ permite à corregedoria fazer o pedido de informações sigilosas, como as fornecidas pelo Coaf.
Ela afirmou também que a corregedoria não promove investigação "criminal" de servidores ou juízes, e os dados foram solicitados pelo conselho ao Coaf para verificar se houve alguma irregularidade no âmbito administrativo.
"Fica patente o equívoco na alegação das impetrantes [as entidades que representam magistrados] de que esta corregedoria enveredou investigação criminal quando, em verdade, a apuração se alicerça na competência constitucional de controle de ilícitos administrativos", afirmou.
Para as entidades de magistrados que recorreram ao STF para suspender as investigações do CNJ, a corregedoria quebrou o sigilo dos 216 mil magistrados e servidores relacionados no pedido ao Coaf.
"O acesso a esses dados pelos órgãos de fiscalização, de maneira reservada e sem qualquer exposição do declarante, não representa qualquer quebra de sigilo", afirma no documento Eliana Calmon.
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