O presidente da Câmara Federal, deputado Marco Maia (PT-RS), criticou nesta sexta-feira a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o depoimento do contraventor Carlinhos Cachoeira à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista montada para investigar sua rede de contatos com agentes públicos e privados. "A posição tomada pelo ministro Celso de Mello foi, na minha avaliação, um pouco precipitada. O Cachoeira, ao ser convocado para ir à CPI, não estava sendo convocado como réu, mas como testemunha, como alguém que poderia ir lá prestar um depoimento importante", disse Maia.
Apesar do habeas-corpus concedido pelo STF, o deputado petista considera inevitável que Cachoeira se apresente à CPI. "É quase impossível que o Cachoeira não seja convocado mais de uma vez para ir à CPI. Ele vai ser convocado duas, três, quatro, cinco vezes, quantas vezes foram necessárias para falar sobre as acusações que ele sofre. Ao mesmo tempo, haverá acareações. O Cachoeira terá que ser acareado com outras pessoas, com outros depoimentos e, portanto, não há nenhuma possibilidade de o Cachoeira não depor na CPI. A decisão tomada pelo STF, pelo ministro Celso de Mello, se mostrou, neste caso, equivocada", reiterou.
Alegando que não haverá tempo para analisar todos os dados, a defesa do contraventor entrou com novo pedido junto ao STF para manutenção da liminar de Celso de Mello. Na quarta-feira, a CPI protocolou no Supremo um pedido de reconsideração da decisão do ministro, que agora terá que analisar as duas demandas.
Maia aproveitou, ao chegar à reunião trimestral do Diretório Nacional do PT, em Porto Alegre, para negar que exista "blindagem" na CPI. "O que estamos vivendo é um momento de ajuste, de definição de quais são os rumos que a investigação irá tomar, de quem será o centro da investigação, o que, na minha percepção, é perfeitamente normal. Estamos apenas iniciando a CPI, que será longa, explosiva, que terá que investigar em várias direções e que não vai acontecer em apenas um mês", justificou, acrescentando que "nada inviabiliza que, daqui a algum tempo, debates sobre convocações de governadores, de deputados ou de outras figuras públicas do País sejam retomados ou aprovados pela CPI. Este é um momento inicial, no qual vão ser colhidos elementos e fundamentos, inclusive, para outras convocações".
Reportagem publicada ontem na Folha de S.Paulo aponta que um acordo entre governo e oposição livraria do foco da CPI governadores, o comando nacional da empreiteira Delta, como o ex-diretor Fernando Cavendish, e parlamentares, inclusive o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO). A matéria diz que a decisão ocorreu depois que PT e PMDB ameaçaram aprovar a quebra de sigilo telefônico do governador Marconi Perillo (PSDB-GO), suspeito de ter vendido uma casa a Cachoeira.
Imprensa
Em resolução aprovada nesta tarde, o PT estabelece que a CPI deve apurar "todas as ramificações da organização criminosa, doa a quem doer", mencionando que "entre as denúncias que precisam ser apuradas a partir de elementos probatórios em mãos da CPMI estão as relações entre o crime organizado e alguns órgãos de imprensa".
Perguntado sobre as escutas da Polícia Federal que indicam que Cachoeira influenciaria nas escolhas jornalísticas e editoriais da revista Veja, Maia respondeu que "todos aqueles que, de alguma forma, tiveram contatos deverão ser ouvidos". Segundo ele, "o caso da Veja, como o de qualquer outro jornalista, se enquadra no mesmo quadro em que se enquadram os políticos, os membros da iniciativa privada. O importante é que a CPI investigue os contatos do Cachoeira estejam eles no setor público, estejam no setor privado".
O deputado contribuiu para a unanimidade do partido em torno do texto que considera que "o que está em jogo é a apuração de fatos criminosos, não os ataques à liberdade de expressão, como tentam confundir setores da mídia conservadora. Quanto aos meios de comunicação, reafirmamos a resolução aprovada no 4º Congresso do PT: "Para nós, é questão de princípio repudiar, repelir e barrar qualquer tentativa de censura ou restrição à liberdade de imprensa"."
Carlinhos Cachoeira
Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de parlamentares que ficou conhecido como mensalão.
Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF apontaram contatos entre Cachoeira e o senador democrata Demóstenes Torres (GO). Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo telefônico não havia obedecido a critérios legais.
Nos dias seguintes, reportagens dos jornais Folha de S.Paulo e O Globo afirmaram, respectivamente, que o grupo de Cachoeira forneceu telefones antigrampos para políticos, entre eles Demóstenes, e que o senador pediu ao empresário que lhe emprestasse R$ 3 mil em despesas com táxi-aéreo. Na conversa, o democrata ainda vazou informações sobre reuniões reservadas que manteve com representantes dos três Poderes.
Pressionado, Demóstenes pediu afastamento da liderança do DEM no Senado em 27 de março. No dia seguinte, o Psol representou contra o parlamentar no Conselho de Ética e, um dia depois, em 29 de março, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski autorizou a quebra de seu sigilo bancário.
O presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), anunciou em 2 de abril que o partido havia decidido abrir um processo que poderia resultar na expulsão de Demóstenes, que, no dia seguinte, pediu a desfiliação da legenda, encerrando a investigação interna. Mas as denúncias só aumentaram e começaram a atingir ouros políticos, agentes públicos e empresas.
Após a publicação de suspeitas de que a construtora Delta, maior recebedora de recursos do governo federal nos últimos três anos, faça parte do esquema de Cachoeira, a empresa anunciou a demissão de um funcionário e uma auditoria. O vazamento das conversas apontam encontros de Cachoeira também com os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás. Em 19 de abril, o Congresso criou a CPI mista do Cachoeira.
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