"É a primeira vacina no mundo contra parasitas. Até hoje, só existem doses contra vírus e bactérias. Ainda precisamos passar por mais três fases de testes em humanos. Completamos apenas a primeira", diz.
A esquistossomose é causada por um platelminto, animal invertebrado, conhecido como Schistosoma e atinge 198 milhões de pessoas na África e 2 milhões no Brasil. Sintomas como anemia, febre e diarreia são os mais comuns.
Os testes iniciais contra a doença foram feitos desde maio do ano passado com 20 adultos voluntários que vivem no Rio, área considerada não endêmica, ou seja, onde não há transmissão ativa do parasita. Cada indivíduo recebeu três doses.
"Essa é uma doença que não interessa a indústria farmacêutica, pois está concentrada em países pobres, com higiene e saneamento básico precários. Queremos que a vacina tenha validade de pelo menos dez anos e seja barata ou de graça, pelo Sistema Único de Saúde", afirma a diretora.
O objetivo dos testes preliminares foi analisar a segurança desse tipo de imunização e verificar a presença de efeitos colaterais como náusea, febre e dor de cabeça. Foi constatada apenas dor local após a aplicação, já que a injeção é intramuscular.
A segunda fase de testes deve começar entre o fim deste ano e o início de 2013, com 200 crianças em idade pré-escolar (até 6 anos), destacou Tânia. Será feita em uma área endêmica, no Brasil e nos países da África, durante cerca de seis meses. A intenção é testar novamente a segurança da vacina contra a esquistossomose.
"Passada essa etapa, será avaliada a eficácia da dose e ampliada a aplicação para milhares de pessoas. Na fase quatro, a escala será de milhões de voluntários", destaca a médica.
Caramujos da espécie Biomphalaria glabrata albina é responsável pela doença (Foto: Gutemberg Brito/IOC)
A imunização contra esquistossomose deve ser destinada a crianças até 6 anos e ser incluída, no futuro, no Calendário Nacional de Vacinação do Ministério da Saúde, segundo Tânia.
A diretora do IOC – que pertence à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) – revela que a vacina é produzida com tecnologia brasileira de última geração, a partir de uma proteína de parasitas do gênero Schistosoma. Essa proteína é transferida para leveduras chamadas Pichia pastoris ou bactérias.
"Assim, a proteína fica mais pura e bem caracterizada, com um melhor padrão de qualidade. É um processo parecido com o da vacina contra a hepatite B", ressalta Tânia.
Assim como em outras vacinas, a dose nacional foi produzida a partir de um antígeno – substância que estimula a produção de anticorpos – para preparar o sistema imunológico do ser humano à infecção pelo parasita. Com isso, evita-se que o parasita se instale no organismo ou que lhe cause danos.
Cerca de 30 especialistas do IOC estão envolvidos nesse projeto, que tem ainda a parceria de três consultores externos.
Até hoje, o tratamento da esquistossomose – que é transmitido aos humanos por água contaminada por esse parasita multicelular, que antes do homem habita caramujos de água doce, do gênero Biomphalaria – é feito com o uso de medicamentos. Mas, como a pessoa não fica imune, precisa tomar novamente o remédio a cada reinfecção.
Como foi feita a vacina
Para a confecção da vacina, os pesquisadores utilizaram a proteína Sm14, obtida do Schistosoma mansoni. A proteína-base da vacina, isolada no IOC ainda na década de 1990, foi escolhida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um dos seis antígenos mais promissores no combate à doença.
O projeto, que acaba de finalizar os testes em humanos, obteve resultados que garantem que a vacina seja segura para uso humano e capaz de produzir proteção para a doença.
O teste em voluntários teve início logo após a aprovação do protocolo clínico de pesquisa pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e foi conduzido pela equipe do Instituto de Pesquisa Evandro Chagas (Ipec/Fiocruz).
Além da vacina contra esquistossomose, a Fiocruz pesquisa vacinas contra os quatro vírus da dengue e contra os parasitas da leishmaniose e da malária.
"Essa vacina pode abrir caminho para as outras. Ser autossuficiente nesse conhecimento não tem preço", destaca a diretora do IOC.
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