Defesas comparam mensalão a Collor e criticam ausência de Lula
Dois ex-presidentes brasileiros foram citados nesta sexta-feira nas defesas de réus do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF). O advogado Marcelo Luiz Ávila relembrou o julgamento de Fernando Collor de Mello (PTB), inocentado da acusação de corrupção pela mesma Corte, ao pedir a absolvição do deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP). Já o advogado Délio Lins e Silva Júnior, que representa o ex-assessor do extinto PL Antonio Lamas, criticou a ausência de Luiz Inácio Lula da Silva entre os acusados de integrar o esquema.
"E o presidente da República, porque não foi denunciado? Sou intrigado com isso, porque o Ministério Público (MP) não denunciou Luiz Inácio Lula da Silva. Nos autos não tem um depoimento sequer dizendo que Antonio Lamas sabia dessa movimentação de dinheiro. Já quanto ao Lula, tem um depoimento dizendo que ele sabia, mas por que ele não figura em nenhuma denúncia?", disse Délio Lins. Apesar de o Ministério Público recomendar a absolvição de Antonio Lamas por falta de provas, o advogado afirmou que isto não é suficiente. "Requeremos que se proclame para que Brasília inteira ouça que Antonio Lamas não é mensaleiro, não é quadrilheiro, não é lavador de dinheiro", afirmou ao encerrar o sétimo dia de julgamento.
Antes de Délio Lins assumir a tribuna do STF, o filho dele, Délio Lins e Silva Júnior, também citou Luiz Inácio Lula da Silva ao defender o ex-tesoureiro do PL Jacinto Lamas. Ele alegou que seu cliente não sabia de nenhum ilícito assim como o ex-presidente, que disse desconhecer o suposto esquema do mensalão e não figura como réu na ação penal. "É tão fácil acreditar no presidente Lula quando ele diz que nada sabia e é tão difícil acreditar em Jacinto quando ele diz que nada sabia, sem que exista um único depoimento nos autos que afirme o contrário", afirmou o advogado.
Terceiro a falar, Marcelo Luiz Ávila começou seu discurso afirmando que iria "inovar" em relação aos defensores dos demais réus ao lembrar o caso ex-presidente Fernando Collor de Mello. Ávila disse que o Ministério Público não conseguiu comprovar o "ato de ofício" necessário para condenar Valdemar Costa Neto. Collor foi absolvido da acusação de corrupção passiva sob o mesmo argumento, de que a procuradoria não conseguiu comprovar o "ato de ofício", ou seja, não se provou que o ex-presidente favoreceu o "Esquema PC" após receber vantagem indevida. "O procurador de certa forma forçou, ou pretende forçar uma reavaliação daquela interpretação", disse o advogado ao criticar a conduta de Roberto Gurgel. O defensor ainda argumentou que o atual deputado não era parlamentar quando recebeu dinheiro do PT e, por isso, não pode ser acusado de corrupção passiva.
Defensor público representa réu no STF
Em meio a advogados de renome, como o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, um dos 38 réus do processo do mensalão foi representado nesta sexta-feira por um defensor público. Haman Tabosa de Moraes e Córdova pediu a nulidade do processo contra o seu cliente, o empresário argentino Carlos Alberto Quaglia. O réu é acusado de lavagem de dinheiro e corrupção passiva por envolvimento na suposta ocultação de repasses de recursos do PT para o PP.
De acordo com o defensor-geral público federal, a defesa de Quaglia foi cerceada por não ter sido representado por um advogado durante a oitiva de testemunhas na fase processual. "É um senhor de 67 anos, que pode vir a ser condenado a 14 anos de reclusão por essas provas frágeis", disse.
Também na sessão desta sexta-feira, o advogado Guilherme Nostre afirmou que o publicitário Marcos Valério não conhecia seu cliente, o empresário Breno Fishberg, acusado de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. "Marcos Valério desmentiu a acusação. Disse, em seu depoimento, que não conhece o denunciado Breno Fishberg tendo, em uma única oportunidade, o visto na corretora. É evidente, Marcos Valério não conhece Breno, ele não era seu interlocutor na Bonus Banval", argumentou o advogado.
O julgamento do processo do mensalão será retomado na próxima segunda-feira, com as sustentações orais de mais cinco advogados, que representam os réus Bispo Rodrigues, Roberto Jefferson, Emerson Palmieri, Romeu Queiroz e José Borba.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
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