Com isso, o país se torna o segundo da América Latina a permitir o aborto, após Cuba. Em outros países latino-americanos, ele é permitido apenas em casos como o risco de vida para a mãe, a má-formação fetal ou de gravidez fruto de um estupro.
A legislação teve 17 de 31 votos. Ela foi apoiada pelos 16 parlamentares da governista Frente Ampla e pelo senador Jorge Saravia, atualmente no Partido Nacional, de oposição.
O projeto havia sido anteriormente aprovado pela Câmara dos Deputados, em 25 de setembro, com 50 votos a favor e 49 contra, após uma negociação dos governistas com o Partido Independente.
Agora, a lei precisa ser promulgada pelo presidente José Mujica. Ele já disse, em diversas ocasiões, que não vetará a iniciativa, como fez seu antecessor, Tabaré Vásquez, em 2008, alegando "princípios éticos".
O Parlamento uruguaio encerrou décadas de debates em torno de um tema que dividiu a sociedade, depois do fracasso de cerca de uma dúzia de projetos de legalização do aborto desde 1978.
Inspiração europeia
Inspirado na legislação de países europeus, o texto prevê a descriminação da interrupção da gravidez desde que a mulher manifeste o desejo de abortar diante de uma equipe de ao menos três profissionais, após estar ciente dos riscos, das alternativas e dos programas de apoio à maternidade e à adoção.
Após a entrevista, a candidata ao aborto deverá aguardar cinco dias para confirmar sua decisão e interromper a gravidez, sempre sob supervisão do Estado.
Mulheres nuas e com os corpos pintados realizam manifestação na frente do Parlamento uruguaio em 25 de setembro. (Foto: Matilde Campodonico / AP Photo)
O processo é dispensado quando a gravidez implica risco grave para a saúde da mulher, quando há má-formação do feto incompatível com a vida fora do útero e quando ocorreu estupro.
Polêmica
O debate colocou em lados opostos quem defende o direito do embrião e as pessoas que consideram o projeto uma alternativa para a ineficácia da atual lei, vigente desde 1938, que pune com a prisão a mulher que fizer um aborto e quem colaborar com ela.
"Esta lei está alinhada com os consensos sociais atuais do Uruguai", afirmou o senador do FA, Luis Gallo, enfatizando que "a sociedade não considera que a mulher seja criminosa quando aborta".
Por serem realizados de forma clandestina, os abortos no Uruguai são difíceis de contabilizar, mas, segundo dados de organizações não-governamentais, neste país de 3,4 milhões de habitantes são registrados mais de 30 mil abortos por ano, diante de 47 mil nascimentos.
Na oposição, o senador Alfredo Solari, do Partido Colorado, considerou que "esta é uma solução ruim para um problema médico e social vivido pelo país", indicando que instaura um sistema complexo e complicado, pois a formação de equipes multidisciplinares será praticamente impossível em grande parte do interior do país.
Além dos debates pró e contra, o texto final aprovado também foi questionado por grupos como o "ProVida" e a Coordenação pelo Aborto Legal, que dizem que a lei não garante à mulher o direito de decidir livremente sobre seu corpo, e que não se trata do projeto original pelo qual lutaram há muitos anos.
Já a organização Médicos do Mundo considera que a lei é "um antecedente positivo" para o reconhecimento dos direitos das mulheres na região.
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