Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) se revezaram em críticas ao sistema prisional brasileiro durante a sessão desta quarta (14) de julgamento do mensalão.
As falas dos ministros começaram com uma manifestação de Dias Toffoli e foram motivadas pela declaração desta terça (13) do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que disse a empresários em São Paulo que "preferia morrer" a ficar numa prisão brasileira. Nesta quarta, Cardozo justificou a declaração dizendo que "não se pode esconder o sol com a peneira".
Ao iniciar a fala, Toffoli destacou que todos os jornais repercutiram nesta quarta a declaração de José Eduardo Cardozo e defendeu que os réus do processo do mensalão sejam punidos com multas maiores e penas menores. Ele destacou que a medida é mais efetiva e tem valor "pedagógico" do que as prisões.
"A filosofia da punição daquele que comete um delito está em debate na sociedade contemporânea há muito tempo. Esse parâmetro do julgamento em 2012 não é o parâmetro da época de Torquemada, da época da condenação fácil à fogueira. Eu fico pensando - temos aqui pessoas que desde 2006 nao têm condição de sair às ruas. Tivemos ministros agredidos, advogados agredidos", afirmou Toffoli.
A intervenção de Toffoli ocorreu durante a discussão da pena de lavagem de dinheiro para o ex-vice-presidente do Banco Rural José Roberto Salgado.
O relator, ministro Joaquim Barbosa, havia proposto prisão de 5 anos e 10 meses e multa de R$ 431,6 mil (166 dias-multa). O revisor, Ricardo Lewandowski, sugeriu pena de 4 anos e 8 meses e multa de R$ 36,4 mil (14 dias-multa).
Toffoli, então, votou pela pena proposta por Lewandowski e pela multa sugerida por Barbosa.
"Aquele que comete um desvio com intuito financeiro – e aqui o intuito final era financeiro, não era violência, não era atentar contra a democracia e contra o estado democrático de direito porque eles são muito mais sólidos do que isso. O intuito era o vil metal. Que se pague, então, com o vil metal", defendeu Toffoli.
Para o ministro, o Judiciário tem aplicado "muito pouco" as penas disciplinares. "Já ouvi leituras dizendo que o pedagógico é colocar na cadeia. O pedagógico é recuperar os valores desviados. Muitas vezes, no cálculo do custo-benefício, vale a pena passar algum tempo na cadeia pelo custo-benefício", declarou.
"Inferno nos presídios"
O ministro Gilmar Mendes falou na sequência e disse que o Judiciário precisa agir para acabar com a superlotação de presídios.
"Temos um inferno nos presídios. Temos 70 mil presos, pelo menos, em delegacias. São presos ilegalmente. Aí [dizem que] não há recursos para fazer presídios. [...] Tínhamos casos de presos no Pará que estavam passando fome. É preciso, realmente, que o governo participe desse debate sobre segurança porque tem os recursos e tem a missão de coordenar. Isso [construção de presídios] nunca foi prioridade e por isso temos esse estado de caos", disse.
"Depósito de presos"
O ministro Celso de Mello, mais antigo do Supremo, também criticou o sistema penitenciário.
"Por responsabilidade imputável ao estado, a crise do sistema penitenciário tem se demonstrado crônica. O descaso, a absoluta negligência, a indiferença do estado às funções da pena. A pessoa acaba por sofrer penas sequer previstas no Código Penal, que a legislação repudia."
Ele lembrou a declaração pública de Cardozo, mas citou que é "grande a responsabilidade do Ministério da Justiça".
"A prática da lei de execução penal se tornou entre nós um exercício quase irresponsável de ficção jurídica, na medida em que o Estado mantém-se absolutamente indiferente, desinteressado, dessa fase de execução das sanções penais determinadas pela Justiça."
Celso de Mello chamou os presídios de "depósito de presos". "O que temos visto na triste realidade penitenciária brasileira é um depósito de presos, pessoas abandonadas a própria sorte, por irresponsabilidade do poder público. Por isso, acho importante que o ministro da Justiça tenha feito de maneira muito cândida e franca no dia de ontem."
Comentários