Silvania durante depoimento à CPI sobre tráfico de pessoas (Foto: Reprodução/Rede Globo)
A denúncia foi feita no dia 14 de outubro, quando Silvânia e Gerôncio, moradores de Monte Santo (BA), relataram ter tido os filhos arrancados de dentro de casa por policiais que não deram nenhuma explicação, apenas afirmaram estar cumprindo uma determinação do juiz. Na ocasião da reportagem, pai, mãe e familiares falaram do sofrimento que têm passado sem saber do paradeiro das crianças.
A mãe adotiva discorda. “Se você pegasse o processo, você diria que não existe juiz em sã consciência que devolva essas crianças [aos pais biológicos]. Porque lá eles [os pais] falam em bebedeira, eles falam que não trabalham, que trabalha dia sim, dia não por causa da bebida, que ela [ a mãe] sai de casa e demora dias para voltar... Então foi encenado sim”, disse a moradora de Indaiatuba.
Dossiê sobre maus-tratos
Oscilando entre tom de choro e revolta, a mãe adotiva conta que a advogada das famílias que adotaram os cinco irmãos tem um dossiê com a situação em que as crianças chegaram ao estado de São Paulo. O documento foi apresentado a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que investiga o tráfico de pessoas no território nacional e que colheu depoimentos nesta terça-feira (27)
“A menorzinha quase morreu no hospital. Ela tinha berne na cabeça, ela tinha mais de 30 picadas de mosquito no rosto, ela tinha uma assadura tipo queimadura de segundo grau. Ela estava realmente abandonada”, relata. A mãe adotiva conta que as crianças menores não falam da vida que levavam em Monte Santo, ao contrário dos mais velhos, que eventualmente verbalizam lembranças que, segundo a mãe, evidenciam os maus-tratos sofridos por eles.
Processo
A mãe adotiva contou que está há três anos inscrita no cadastro nacional de adoção e que soube da história das crianças da Bahia por meio de uma conhecida, que a colocou em contato com Carmen, acusada de ter intermediado a adoção. A mãe disse que é envolvida desde muito cedo com projetos sociais e fez questão de se certificar com a intermediadora baiana que as crianças não estavam sendo retiradas dos pais por serem pobres.
“Eu questionei muito porque, pelo amor de Deus tirar filho de mãe por causa de pobreza. Eu perguntei para ela [Carmen] e ela disse: "Não, de maneira alguma”, lembra a mulher, explicando que foi informada que havia uma determinação da promotoria para que as crianças fossem retiradas da família por conta de maus-tratos.
Durante a conversa, a mãe adotiva contou, ainda, que estranhou o fato de os pais e a promotoria não terem participado da audiência sobre a adoção, mas como não se tratava de um processo de adoção, e sim de guarda provisória, imaginou que eles seriam ouvidos em outro momento.
A mulher, de 40 anos, disse estar confiante que a Justiça permitirá que o filho permaneça na casa dela. "Eu quero fazer um apelo para que as pessoas parem de ser hipócritas e pensem na vida dessas crianças. Eu não estou falando da vida material, eu estou falando da vida psicológica. Estas crianças já estão há um ano e meio com a gente, elas sabem o que é comer uma comida todo dia. Meu filho, o primeiro prato dele quando ele chegou aqui era maior que o meu. Eles comiam que nem doidos porque não sabiam quando seria a próxima refeição".
‘Sequestro’, diz defesa
O advogado de defesa dos pais biológicos, Maurício Freire, negou todas as acusações da mãe adotiva. Segundo o defensor, as crianças eram “bem alimentadas e acarinhadas” pela família. “Isso não consta no processo e, para nós, é uma inverdade. Silvania nunca foi prostituta e, mesmo se fosse – falo em função de todas as mães que são prostitutas –, isso não seria motivo. Essas crianças nunca foram maltratadas pelos pais”, afirmou.
Freire reiterou a afirmação de que o processo que deu a guarda provisória aos casais de Campinas e Indaiatuba é nulo. “Não há motivo para este sequestro, ainda que autorizado pela Justiça. Isto é uma reação anacrônica, reação incompetente”, falou.
Sobre a tentativa da família reverter a devolução das crianças aos pais, o advogado disse que é um direito dos pais adotivos, mas que cabe à defesa “rechaçar” o recurso, já que a defesa entende o caso como um “sequestro oficializado pela Justiça”.
“Quero crer que o bom senso prevaleça. Que essas famílias reconheçam que essas crianças foram sequestradas através de um ato judicial ilegal e inconstitucional”, diz.
*Colaborou Tatiana Dourado, do G1 BA
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