Após denúncia de 'pastel de cachorro', lanchonetes perdem clientes no Rio
Claudinei da Conceição, de 36 anos, vai sempre à pastelaria chinesa que fica ao lado do trabalho, em Parada de Lucas, e já comeu todos os salgadinhos que o local oferece — inclusive um “delicioso” pastel de carne. No entanto, foi nesta lanchonete que fiscais do Ministério Público do Trabalho (MPT) acharam animais que pareciam cachorros mortos dentro de uma caixa de isopor. Claudinei não se abalou, mas a revelação gerou clima de desconfiança em outras lanchonetes da cidade.
— Se usaram mesmo, nunca senti nenhum gosto diferente — afirmou Claudinei.
Segundo reportagem publicada no “O Globo”, o chinês Van Ruilonc, dono da loja, afirmou que o uso de carne de cães na produção de pastéis é uma prática comum nas lanchonetes chinesas, e que recolhia os animais nas ruas do bairro.
— Não vou nunca mais numa pastelaria chinesa. Usar cachorro é muito nojento, não quero arriscar — afirma a garçonete Monique Nogueira.
— Acabei de comer uma esfiha de carne. Mas, agora, já não sei se é de carne mesmo — brincou a cabeleireira Juliana de Sá, de 23 anos.
A pastelaria em Parada de Lucas foi fechada na época da descoberta. O MPT havia recebido denúncias de que Van mantinha um funcionário em regime análogo à escravidão, e encontrou um chinês que sofria até castigos físicos durante o trabalho.
— O que encontrei naquela pastelaria foi o pior de tudo. Havia uma cela, como se fosse uma cadeia, com grades e cadeado, montada dentro da lanchonete, onde o trabalhador ficava encarcerado — afirmou a procuradora Guadalupe Louro Couto, em entrevista ao “O Globo”.
A vítima foi incluída em programa de proteção à testemunha. Van foi condenado a oito anos e seis meses de prisão por tortura qualificada e crime de redução à condição análoga a de escravo.
No ano seguinte, o estabelecimento foi reaberto. Um funcionário afirmou que novo dono ocupou o local. Mas vizinhos afirmam que o homem é sobrinho da mulher de Van.
Até agora, o Ministério Público do Trabalho resgatou cinco chineses trabalhando em condições análogas à escravidão no Rio: além do rapaz em Parada de Lucas, foram três em Copacabana e outro em Mangaratiba.
Os chineses vêm da cidade de Guangzhou, na província de Guagdong. Eles teriam sido aliciados para receber R$ 2 mil, mas quando chegavam aqui acabavam sendo obrigados a trabalhar em jornadas de trabalho fora da lei trabalhista brasileira, e tinham os documentos retidos pelos empregadores.
O Procon estadual fez uma operação no dia 13 de março, quando autuou 15 dos 16 estabelecimentos que visitou, sendo que um deles foi fechado por problemas de higiene e falta de documentos. O caso mais grave foi o Bonde do Yakisoba, em Vicente de Carvalho, onde até um gato foi encontrado sendo criado no local onde se guardavam as panelas. Em nenhum deles, porém, havia carne de cachorro para consumo.
A presidente da Sociedade União Internacional Protetora dos Animais (Suipa), Izabel Nascimento, afirmou que recebe denúncias de uso de animais domésticos como recheio de salgadinhos há dez anos. “Mas as pessoas têm medo de levar adiante”, explica. A mais comum é a de que chineses pegam gatos no Campo de Santana, no Centro, para fazer pastel.
A presidente da Suipa afirmou que ficou indignada com a situação, e sugeriu que haja boicote a pastelarias dirigidas por chineses: “Não importa que é da cultura deles”, afirmou Izabel.
A Vigilância Sanitária afirmou, em nota, que articula novas fiscalizações para combater o uso de carne de cachorro em salgadinhos.
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