DF: Agnelo promete fim da Operação Tartaruga e PM ameaça radicalizar
Foi preciso que o número de homicídios no Distrito Federal chegasse a 73 apenas no mês de janeiro para que o governador Agnelo Queiroz (PT) decidisse chamar para si a responsabilidade pela crescente onda de violência que tomou conta da capital do País. Em menos de 24 horas, o petista participou de duas reuniões com a cúpula da segurança pública do DF e saiu delas com a promessa de que a Operação Tartaruga dos policiais e bombeiros militares chegou ao fim.
“A vida é a coisa mais importante. A vida é mais importante que a política. Por isso que a PM tem a obrigação de garantir a segurança pública do DF. Nossa PM tem comando. Não (podemos) admitir, em hipótese alguma, que meia dúzia de pessoas, com atitudes inclusive covardes, possam colocar em risco a segurança do nosso povo. Eles não têm direito de colocar a vida das pessoas em risco”, disse Agnelo em pronunciamento após a reunião. Ele se recusou a responder as perguntas dos jornalistas.
O compromisso firmado pelo comandante-geral da Polícia Militar, coronel Anderson Carlos de Castro Moura, é de que os militares, inclusive coronéis e comandantes, trabalharão todos os dias até que a corporação restaure a ordem nas ruas do DF. Segundo ele, todos os policiais que participaram da Operação Tartaruga, instaurada há dois meses, passarão por um procedimento disciplinar, podendo ser punidos com advertências e até mesmo demissão do cargo em que ocupam. Até o momento, foram identificados cinco policias, entre oficiais e praças.
Agnelo e o comandante da PM fazem questão de ligar a crise na segurança pública a uma briga política nos bastidores. Os artífices da operação, no entanto, têm outro argumento para justificar a falta de empenho no combate ao crime. O subtenente Ricardo Pato e o tenente Jorge Martins, esse último conhecido como Tenente Poliglota, são apontados pelo Conselho de Disciplina da PM como lideranças do movimento.
Pato já deu diversas entrevistas comemorando o aumento da violência no DF. Poliglota, por sua vez, tem um blog no qual mantém textos insuflando os colegas a endurecer o atraso no atendimento à população e dispara críticas a seus superiores.
“Mais de 50% da categoria aderiu à Operação Tartaruga, o que, para nós, é um sucesso. A população está nos apoiando porque está vendo o que nós passamos e como nosso trabalho é necessário. A Polícia Militar não está em greve, todas as viaturas estão circulando. A diferença é que o trabalho, agora, não tem o esforço a mais de todos os dias. Não estamos mais ultrapassando a velocidade máxima permitida da via para atender ocorrências e também não estamos nos articulando no local do crime para investigar e prender os responsáveis porque esse é um trabalho da Polícia Civil”, tenta justificar o tenente.
A ameaça de Agnelo e do comandante-geral da PM, que chamaram de falsas lideranças os policiais que insuflam a tropa, reverberou negativamente entre a categoria. O presidente em exercício da Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares do Distrito Federal (Aspra-DF), sargento Sansão Barbosa, disse que o governo radicalizou e que vai haver reação dos policiais.
“Ele radicalizou, nós vamos radicalizar. Nós vamos parar a polícia. Não tem falsa liderança, não. Sou eleito na Aspra desde 2001 porque tenho coragem de defender a categoria. Vamos parar esse fim de semana, vamos marcar um dia e hora para parar geral, de 12 a 24 horas. Vamos radicalizar”, ameaçou.
Em pontos de ônibus e postes de toda a cidade, cartazes assinados pela Aspra apontam que a paralisação será feita ainda em fevereiro. A associação atribui a culpa pela onda de violência ao governador Agnelo Queiroz, que, segundo a PM, não cumpriu 13 promessas de campanha, entre elas a de reajustar o salário dos policiais militares.
“São 30 mil cartazes. Em cada região tem um representante da Aspra distribuindo. É tartarugão na cabeça, não mudamos, não adianta ameaçar no jornal, fazer reunião, quem manda são os policiais”, completou o sargento Sansão Barbosa.
Medo
Enquanto policiais militares e GDF não entram em um acordo, a população é quem paga o preço. Apenas no primeiro mês de 2014, o número de mortes violentas chegou a 73, sendo 68 homicídios e cinco latrocínios. A média é de 2,4 casos por dia. Os ataques contra a vida superam em 37,7% a quantidade registrada no mesmo período de 2013.
Nos últimos dias, a escalada da violência criou uma sensação de medo generalizada. Em Águas Claras, bairro a 20 quilômetros do centro de Brasília, um jovem foi morto a tiros em frente a sua casa, uma dona de casa foi rendida e teve o carro, a bolsa e o celular roubados e uma lavanderia foi arrombada. Os episódios ocorreram em um raio de 500 metros de distância.
“Vi os homens levando o carro. Uma amiga dela ligou para passar a placa do carro para a polícia ir atrás, mas a moça que atendeu fez pouco caso, nem sequer anotou. Quando ligamos depois, ela não sabia o número, e tivemos de passar novamente. Vimos a falta de vontade da polícia”, disse a filha da dona de casa, que preferiu não se identificar.
Ainda na noite de ontem, uma pane atingiu o Centro Integrado de Atendimento e Despacho (Ciade) da Polícia Militar. Das 20h às 21h, a população deixou de ser atendida. Nenhuma ocorrência pôde ser registrada pelos militares, e o cidadão que, eventualmente, entrou em contato com a polícia por meio do 190 não conseguiu completar a ligação. Pouco depois das 21h, uma pequena parte do sistema havia retornado ao normal, mas a maioria dos terminais de atendimento seguia no escuro. Alguns servidores que trabalham no Ciad garantiram se tratar de uma sabotagem por parte dos colegas em Operação Tartaruga.
A crise já preocupa a imagem do PT e chegou até o Palácio do Planalto, que vê com críticas a operação tartaruga que vem sendo realizada pela Polícia Militar do DF. Apesar de ponderar que a capital federal tem um custo de vida elevado, o Planalto lembra que os policiais brasilienses são os que ganham mais. “Aqui está havendo uma coisa gravíssima que é a sabotagem policial”, disse um interlocutor direto da presidente Dilma Rousseff.
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