Este domingo (4) marca o 30º aniversário do primeiro relato científico sobre pessoas contaminadas pelo HIV. O trabalho analisava o caso de cinco homens jovens e aparentemente saudáveis que tiveram pneumonia. Dois deles haviam morrido. A deficiência imunológica por eles apresentada viria a ser conhecida como Aids.
Três décadas depois, o Brasil pode se orgulhar de ter adotado o melhor programa público contra a Aids no mundo, na visão do cientista político Eduardo Gómez, da Universidade Rutgers, nos EUA.
Ele fez uma pesquisa comparando as políticas de Brasil e EUA para doenças para as quais os investimentos públicos podem eventualmente não ser bem vistos por determinados setores da sociedade, como Aids, sífilis, obesidade, entre outras.
Gómez aponta que, desde o início, nos anos 80, o governo, as organizações e as comunidades de portadores de HIV agiram de forma mais integrada no Brasil que nos EUA. “As comunidades de Aids em San Francisco e Nova York não se comunicavam. Quando a Aids apareceu nos EUA, houve muita discriminação. No Brasil também houve, mas o governo foi mais receptivo”, explica.
O fato de o país estar saindo do governo militar e a aprovação da Constituição de 1988, que menciona que a saúde é "direito de todos e dever do Estado", contribuíram para o forte investimento num programa de combate à doença.
Já nos EUA, o ambiente mais conservador sob os presidente Ronald Reagan e George Bush prejudicaram a adoção de medidas nacionais e agressivas. Grupos religiosos influentes, aponta Gómez, defendiam a ideia de que a Aids era um castigo divino aos gays. “O Brasil sempre foi mais aberto ao tratamento de doenças sexualmente transmissíveis”, diz.
A pressão da comunidade internacional foi outro fator que fez com que o Brasil investisse num programa de Aids. “Conversei algumas vezes com o presidente (Fernando Henrique) Cardoso e ele era muito preocupado com isso. Queria mostrar que o país estava preparado para fazer frente à doença”, conta Gómez.
O resultado foi que atualmente o Brasil oferece medicamentos gratuitamente a todos os infectados, enquanto nos EUA há mais de 8 mil pessoas esperando para receber remédios. Hoje, países africanos, os mais atingidos pelo HIV, tentam replicar a iniciativa brasileira, mas lutam contra a falta de recursos.
Excesso de prioridade
Apesar de destacar o programa brasileiro para Aids como algo positivo, Gómez aponta que a doença no Brasil pode ser considerada sob controle e segue havendo um investimento desporporcional em seu combate.
“É uma má ideia gastar muito dinheiro em Aids e esquecer as outras doenças. Há um problema nessa tendência, que acontece em todo o mundo. O único país que não fez isso é a Rússia. Eles decidiram investir em câncer, alcoolismo, problemas mentais”, explica.
“A tuberculose voltou ao Rio e São Paulo e não recebe os mesmos recursos (que a Aids), aponta o pesquisador. O Sistema Único de Saúde (SUS) tem dinheiro limitado e precisa responder a todos esses itens: diabetes, problemas do coração, obesidade”, destaca o pesquisador, ao defender que a presidente Dilma Rousseff deveria ter como maior prioridade de seu governo um aumento de recursos para a saúde pública.
Comentários