O bairrismo cuiabano Derrota de Eurico Gaspar Dutra na Capital contradiz a tradição dessa gente
Não conheço nenhum povo com índice maior de bairrismo que o cuiabano.
Sempre foi assim.
Quando fui concluir os meus estudos no Rio de Janeiro, inicialmente fiquei hospedado em uma pensão no Catete.
A proprietária era de Corumbá, assim como a mãe e filho.
Ela fornecia excepcionalmente, refeições avulsas para algumas pessoas.
Lá conheci um casal de amigos e filho.
Quando fui concluir os meus estudos no Rio de Janeiro, inicialmente fiquei hospedado em uma pensão no Catete
Ele era coronel do exército na ativa e trabalhava no Ministério da Guerra.
Ela professora do Colégio Pedro II.
Seu filho único cursava Química Industrial na Praia Vermelha, Universidade do Brasil.
Eu era um verdadeiro “bicho do mato”, com muita dificuldade de interagir com as pessoas desconhecidas.
Sofri bulling por falar com o sotaque cuiabano, sem chiado do carioca, no Colégio Anglo Americano, frequentado na sua maioria por estudantes nascidos no Rio de Janeiro.
Não falava errado, mas sem o chiado, motivo de gozação especialmente das minhas colegas.
No horário do recreio minhas colegas faziam um círculo para conversar comigo, e se divertiam com meu jeito caipira de comportar e principalmente de falar.
Lá fora quase nada se conhecia de Cuiabá e do Estado de Mato Grosso.
Tínhamos pouco representatividade no Rio de Janeiro (1953) e as nossas personalidades, não eram bem vistas.
Tinha acabado de deixar a Presidência da República, um cuiabano, que “fugiu” da pobreza da sua família e cidade para estudar no Colégio Militar.
Foi um oficial de elite, ocupou todos os cargos importantes da sua carreira, inclusive ministro da Guerra e Presidente eleito democrático do Brasil.
Fez um governo bom e ético proibiu o jogo de cassinos no Brasil.
Ficou conhecido pela sua feiura e modo cuiabano de falar, que o prejudicou muito.
A única vez que o cuiabano não foi bairrista foi quando votou no bonito e carioca brigadeiro Eduardo Gomes.
Eurico Gaspar Dutra, militar do Exército, perdeu as eleições presidências em Cuiabá, para o militar da Aeronáutica, seu adversário político.
Dutra, porém, ganhou no Estado de Mato Grosso.
Certa ocasião, almoçando como o casal, coronel do Exército e esposa, perguntei se conheciam Cuiabá.
Responderam-me que ainda não.
Intrigado com a falta de conhecimento (I) e silêncio, não arrisquei a desfilar uma série de personalidades cuiabanas que faziam parte da história do Brasil.
Eurico Gaspar Dutra, Cândido Mariano da Silva Rondon, Joaquim Murtinho e Dom Francisco de Aquino Corrêa.
Até hoje me lembro desse célebre almoço e dos nomes que citei.
Sou um cuiabano bairrista, mas não doentio, que provo com a história da minha vida.
Gabriel Novis Neves é médico e ex-reitor da UFMT
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