O golpe de 1º de Abril Os líderes da oposição foram cassados, banidos ou assassinados
Acordei naquele 1º de abril de 1964 com a maior gritaria no rádio, pois meu pai sempre ligava o seu potente Jefferson de madrugada, assim que levantava.
Não entendi muito bem o que estava acontecendo, mas quando me preparei para ir à escola, seu Natalício me disse que não haveria aula, pois, tinha “estourado a revolução” e eu deveria pegar meu petiço e ir avisar a diretora da escola, que não deveria estar sabendo da determinação das autoridades.
Cheguei à casa da diretora, que morava no prédio da escola, e passei o recado do meu pai. Ela riu me respondeu: “Mas esse compadre pensa que me engana, querer me atochar um 1º de abril logo cedo...”
Algumas professoras que vinham de outra cidade também tinham visto as pessoas acenar e gritar para elas que não haveria aula, mas elas também pensaram que era 1º de abril.
Peguei meu pingo fui indo embora meio chateado. Mas logo olhei para trás e vi a turma voltando para casa. Ah! Meu pai estava certo...
Foi assim que vi nascer a revolução de mentira, mas o golpe de verdade. Golpe na Constituição, golpe nas instituições, golpe no povo.
Ao declarar vaga a Presidência da República, no meio da madrugada, numa sessão ilegal, o senador Moura Andrade fez o papel sujo de congressista sabujo, dando fumos de legalidade ao golpe militar.
O aparato militar do presidente desmoronou com ministro da Guerra hospitalizado e com as traições, como a do seu chefe do estado maior, Castelo Branco e do comandante do IIº Exército, general Amauri Kruel, amigo e compadre de Jango.
Leonel Brizola ainda pediu a Jango que o nomeasse ministro da Justiça para ele articular a resistência civil e o general Ladário Teles para, como ministro da Guerra, organizar o aparato militar com os oficiais nacionalistas. O presidente não queria derramamento de sangue no Brasil e partiu para um longo exílio, do qual não voltou vivo e teria sido envenenado por ordem dos militares.
Quem fala que João Goulart seria um homem fraco e despreparado, desconhece a história e faz o jogo dos golpistas que tinham medo de uma reeleição dele ou a eleição de Leonel Brizola.
Jango foi vice-presidente de Juscelino, eleito com mais votos que este, e depois reeleito vice de Jânio Quadros. Fora Ministro do Trabalho de Getúlio Vargas e deputado federal. Logo, conhecia o governo por dentro. Tinha sido um grande negociador com os sindicatos e era respeitado por ser um político de palavra.
E é certo que se as reformas propostas por Jango e reafirmadas no comício da Central do Brasil, fossem implementadas, o povo iria querer a continuidade do governo nas mãos do PTB.
Como dizia Brizola, Jango foi retirado do governo muito mais por seus acertos que por seus erros. A elite latifundiária e os sanguessugas associados às multinacionais não queriam a continuidade de um governo popular e disposto a mudar o cruel modelo econômico concentrador de renda.
Fazendeiro e habilidoso negociador de gado, Jango era um homem muito rico, mas tomava chimarrão com os peões, conversava com os trabalhadores, conhecia a vida dos pobres. Jamais houve qualquer acusação de improbidade contra ele.
Derrubado o presidente, os milicos começaram devagar, com a fala mansa do general Castelo, garantindo as eleições de 1965. Mas foram tomando gosto, com o próprio general cearense prorrogando seu mandato por um ano. Depois acabaram com as eleições e os presidentes passaram a ser escolhidos pela cúpula militar.
De golpe em golpe, chegou-se em 1968 ao Ato Institucional nº 5, instrumento que dava ao general de plantão, mais poder que teve o imperador Pedro II.
Os líderes da oposição foram cassados, banidos ou assassinados. Os líderes populares presos, torturados e mortos. As instituições dominadas pelos piores bajuladores e alcagüetes. A imprensa censurada e comprada.
A economia fraudada em falso milagre que de um lado entregou os melhores negócios ao capital externo especulativo e de outro nos legou um dívida que até hoje suga quase metade dos recursos orçamentários da União.
E ainda tem gente que diz ter saudades dos militares, ou um cara de pau como Célio Borja, que serviu tanto à ditadura, quanto a Sarney e Collor, que veio dizer que era um governo forte, mas não ditadura.
Mas o pior legado dessa noite de 21 anos de autoritarismo são políticos e o modelo político que nos restou. Qualquer reforma que não começar pela reforma política vai fracassar, e vamos seguir até o dia que o povo na rua vai fazer a verdadeira revolução.
ADEMAR ADAMS é jornalista
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