Mitos cuiabanos
Nossa gente sempre gostou de cultuar figuras folclóricas da cidade. Com o tempo muitas delas se transformaram em mitos.
De todas as figuras folclóricas da minha infância citarei apenas três. Elas caíram no agrado popular e são reverenciadas até hoje. Pelas suas peculiaridades são consideradas precursoras da modernidade.
São eles: “General Saco”, “Peteté” e “Maria Taquara”.
O “General Saco” era um morador de rua esquizofrênico crônico. Passava o dia todo discursando nos lugares onde havia público. Vestia-se com um paletó cheio de velhas medalhas sem nenhum valor grampeadas no casaco. Algumas delas eram simples tampas de cerveja.
Ganhava parcos cruzeiros (moeda da época) dos pacienciosos cuiabanos para a sua manutenção. A população se divertia com o seu chato palavrório, origem do seu apelido “General Saco”.
“Saco” era uma expressão muito usada naquele tempo e significava paciência.
Morreu onde viveu - na rua. Nunca despertou a compaixão nem a solidariedade de ninguém. Serviu de diversão e deboche para a sociedade.
O “Peteté” era um oligoide, negro e andarilho, apesar de manco. Perambulava por aí elegantemente trajado e sempre com um leque – ou abanico – nas mãos. Falava “tatibitate”, tinha a língua presa, origem do seu apelido. Fazia a alegria da criançada com o seu linguajar, vestuário e trejeitos comportamentais extravagantes.
Finalmente, a mais famosa das personagens das ruas da minha meninice – “Maria Taquara”. Transformada em mito após o seu falecimento com direito póstumo a ser nome de praça com a sua escultura.
Quando viva, essa mulher magérrima, de corpo fino tal uma taquara, desfilava sem roupa no meio das ruas de Cuiabá, falando alto frases desconexas, incompreensíveis e causando pavor às crianças, que se agarravam com força ao corpo dos adultos que as acompanhavam.
Hoje essa cena seria impossível de ser vista, pois a polícia prenderia a pobre e necessitada mulher por atentado violento ao pudor.
Transformada em mito, é considerada uma mulher exemplo de comportamento libertário, a ser seguido como modelo pelos jovens.
“Maria Taquara” foi uma mulher que nunca contou com a compreensão ou com solidariedade humana da nossa população. Uma doente emocional abandonada à própria sorte.
Carinho. Sentimento que nunca esteve presente aos mitos que criamos.
Gabriel Novis Neves
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