O (sagrado) sigilo das pessoas
A quebra ilegal de sigilo fiscal e de outras informações, de repente, passou a polarizar a campanha eleitoral. Em vez de usar o tempo para dizer aos eleitores as razões para neles votar, os candidatos desaguaram na discussão sobre quem entrou (e por quê) nas informações contidas sobre seus adversários, em bancos de dados públicos. Os oposicionistas colocam-se como vítimas e tentam atribuir culpa aos situacionistas e estes fazem praticamente o mesmo. Todos desperdiçam o valioso tempo da campanha com a troca de imputações e até de ofensas.
Se houve a quebra ilegal do sigilo – seja lá de quem for -, isso não é tema para campanha eleitoral. É caso de administração, polícia e justiça. Os administradores dos sistemas violados têm o dever de promover a mais rigorosa apuração e proporcionar as facilidades para que a Polícia e o Ministério Público identifiquem os responsáveis pelos supostos crimes e os denunciem à Justiça, onde devem responder pelos seus atos, na forma da lei. Se não adotarem as providências saneadoras, os administradores estarão prevaricando em suas funções e, também, não poderão ficar impunes.
Independente de estarmos às vésperas de uma eleição, as informações sobre contribuintes ou pessoas – influentes ou não – devem ter o sigilo garantido. Essa exigência é explicita na Constituição e na legislação ordinária.
O uso eleitoral das informações, embora grave, pode ser considerado o mal menor. O conhecimento do patrimônio, dos hábitos e de detalhes sigilosos da vida das pessoas, notadamente as de posse ou influência, pode estimular e contribuir para a escolha das vítimas para assaltos, seqüestros, extorsões, assassinatos, espionagem industrial e outros crimes. Principalmente num país onde o crime organizado tem grande ação, a ponto de até confrontar as autoridades.
Os governantes têm a obrigação de exigir investigação altamente transparente para todos os casos de violação do sigilo nos bancos públicos de dados. Mas, independente deles, o próprio sistema, por seus gestores e corregedorias, como dever de ofício, têm uma série de providências a adotar. Fisco, órgãos de segurança pública e justiça e todos os demais que manipulam informações sobre pessoas têm de preservá-las, só abrindo-as nos casos previstos em lei ou mediante processo judicial, que também segue o tramite legal. Tudo o que se fizer em contrário, é crime. Devem responder civil e criminalmente os funcionários executores ou facilitadores e, solidariamente, seus superiores hierárquicos quando, no devido tempo, não tiverem adotado as providências saneadoras e punitivas previstas na lei e nos regulamentos da administração pública. É o mínimo que se pode deles esperar...
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
aspomilpm@terra.com.br
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