Questão de coerência
Somos um povo cordial e intimista. Assim fomos caracterizados por Sérgio Buarque de Holanda. Mas, a par dessas características, eu diria também que o brasileiro é espalhafatoso, alegre e apaixonado. Das paixões brasileiras destaques para o carnaval, futebol e política. E os feriadões? Produto genuinamente brasileiro - vem um agorinha mesmo se aproximando.
Mas, vamos falar da política, ou melhor, do período eleitoral. Nessa época, todo mundo dá o seu pitaco. Até eu que escrevo sobre amenidades, fui contagiado por esta paixão.
Dos nossos três maiores candidatos ao governo do Estado, dois são velhos políticos profissionais e o outro nunca exerceu um cargo público e não é político profissional.
Sempre quis entender por que os velhos políticos nunca conseguiram resolver os nossos problemas básicos. Oportunidades? Tiveram, e muitas.
Temos certo candidato a governador que, quando foi legislador por oito anos, apresentou apenas dois projetos importantes ao povo de Mato Grosso, especialmente ao de Cuiabá (ainda Capital). Foi contra a Lei do Nepotismo no serviço público. Chegou a ir a Brasília, perante o presidente do Supremo Tribunal Federal, protestar sobre a inconstitucionalidade e imoralidade da nova lei, que dificultava a ocupação familiar nos cargos públicos. E o que falar da lei da divisão de Mato Grosso, roubando de Cuiabá o direito constitucional de ser capital do estado? De projeto só esses dois. O resto do tempo que passou na Casa do Povo foi todo consumido em assinar os famosos cheques conjuntos e estudar, creio que Direito. Por pudor nunca citou a faculdade, horário, frequência às aulas, locais de estágio e se tem carteirinha da OAB. Sabemos por declaração do próprio candidato, em rede de televisão para os 141 municípios do estado, que é proprietário da maior rede de comunicação do estado. Não declarou esses bens ao Tribunal Regional Eleitoral, pois, segundo ele, como parlamentar está impedido por lei. Na área esportiva, destacou-se como garupeiro do agricultor que lhe deixou como herança o comando do governo, para o revezamento daqui a quatro anos. Promete se eleito, criar em Cuiabá, a Casa da Moeda para sustentação financeira dos seus arrojados e caríssimos projetos, que deixarei de citá-los por falta de espaço e por ser do conhecimento público.
Outro candidato ao governo foi a minha grande frustração. É meu amigo querido e sempre o incentivei na corrida ao Paiaguás. Sinto orgulho da sua biografia, e do moleque que nasceu comigo ser meu xará. Estivemos juntos até nas últimas eleições (1º e 2º turnos), para a prefeitura de Cuiabá. Infelizmente erramos, e ele errou demais no seu 2º mandato como prefeito. Desta vez ele recebeu cartão vermelho dos seus velhos amigos, por indisciplina. Uma ocasião conversando com um político, que durante 20 anos ficou afastado da política e retornou, ficando até morrer, ele me disse: "Na política, só existe a porta de entrada. Não há porta de saída."
O terceiro candidato é aquele que nunca foi político profissional. Observo no momento um ataque de artilharia pesada em sua direção. Sempre diz com orgulho onde estudou, sente vaidade em dizer que começou a sua vida profissional com um diploma de uma universidade pública conceituada, numa indústria de fundo de quintal. Declarou todos os seus bens na Receita Federal e Tribunal Regional Eleitoral. Recebeu incentivos fiscais? Sim, como a maioria dos grandes empresários do agronegócio, frigoríficos, bebidas, cimentos etc. Receber incentivos fiscais não é crime, é lei. Esse empresário competente e vitorioso deve o seu sucesso única e exclusivamente ao seu trabalho.
Vamos cobrar os insucessos dos que estiveram no poder e fracassaram, ou dar oportunidade a um vencedor que demonstrou competência para pilotar a máquina pública?
Gabriel Novis Neves é médico em Cuiabá e escreve em A Gazeta às quintas-feiras
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