Mentiras sobre o Rádio cuiabano
Uma brincadeira falada mais de três vezes, passa a ser verdade, cultura, tradição e até lenda. Cultura de uma semana apenas, tradição de mês e lenda de menos de ano. Só aqui.
Pulo a rica história do Rádio antes da década de quarenta e vou direto à década de cinqüenta. Em 1952, com dez anos de idade, calças curtas, me atrevi a inscrever-me num concurso público para a nobre função/profissão de locutor na Rádio A Voz d’Oeste que publicava edital convocando os interessados.
Mês depois, o operador e sonoplasta, Mário “Coquinho”, gritava para mim, do outro lado da rua 13 de junho, em frente da “Motosblim”, do Névio Lotufo sobre a minha aprovação em primeiro lugar naquele concurso e que a emissora já estava divulgando e convocando com urgência.
Fomos três os aprovados. Fui aprovado em primeiro lugar. Em segundo lugar estava o hoje sumido Albieri Fortes que preferiu continuar em sua profissão de agente aeroviário da VASP e, em terceiro lugar, Eugênio de Carvalho, com aquele vozeirão bonito que Deus lhe deu.
Cuiabá nunca mais foi a mesma. A emoção em participar do grande “Cast artístico” da mais famosa emissora de Rádio do centro-oeste brasileiro, ao lado de heróis de meu tempo, Adelino Praeiro, Alves de Oliveira, Augusto Mário Vieira, Ana Maria do Couto (May), maestro Cadorna Augelli, Elita Lopes Gardés, Jacy Amorim, Zelão, Peró, Fanaia, Rabello Leite, Ranulpho Paes de Barros, Newton Alfredo, Roberto Jacques Brunini e quantos outros...
Não vou “nem citar” as peripécias, as conquistas e até os sustos. Pulo tudo que está armazenado nos arquivos implacáveis de nossa História de verdade sobre o Rádio em Cuiabá e passo direto para a década de 70 e 80, quando Mato Grosso, principalmente Cuiabá, sofreu a maior avalanche de migrantes do país e do mundo inteiro, ajudando-nos no progresso de nossa terra, de nossa gente e de nossos valores.
De repente, surgiram nos horizontes de Cuiabá, pais e mães do Rádio daqui. Mudaram histórias, colocaram a Rádio A Voz d’Oeste de cabeça para baixo, pintaram e bordaram com publicações na imprensa de nossa terra sobre devaneios e fantasias onde o que mais se lia era: “Antigamente, Cuiabá não existia... Aqui era uma completa escuridão... Quando aqui cheguei, fez-se a luz”.
A “gente” estava perto de Deus e nem sabíamos! “O Rádio não existia”. “Eu quando cheguei à Cuiabá, inventei o Rádio”... Ou a famosa quanto também ridícula frase: “O Rádio daqui jamais ficava no ar após as dez horas da noite”!
Nem um pio sobre o rigoroso profissionalismo, tão sério que um simples engasgo, gerava demissão. Hoje, implantaram o costume da gritaria de alto-falantes, o pigarro, a tosse e até o catarro para o nojo dos ouvintes.
Omitem profissionais das conquistas da estirpe do locutor Pompeo Filho, ex-Presidente do Poder Judiciário de Mato Grosso, do exímio sonoplasta Wandir Clait Duarte, também ex-presidente do TJMT; Valdenir e Elizete Figueiredo, Bruno Spadoni, Clarisse, Joana Padilha, Jercy Jacob, Ivete Santos Leque, Zé Avelino, Pepe, maestro China, Amaral Júnior, Willy Luiz Han... Época de Ouro do Rádio daqui.
Apresentei por muito tempo o programa “Nossa Discoteca” e o “Tango a Média Luz”, este que começava meia-noite em ponto e “ia” até as quatro da manhã quando entravam Cafezinho e Cambará com seus programas sertanejos. Isso, para não falar nas conquistas perante o Brasil inteiro. Do Ivo de Almeida que até foi contratado pela Rádio Bandeirantes de SP, do extraordinário cantor “A Voz de Ouro ABC”, nosso Juarez Silva e seu troféu da Rádio Nacional do Rio de Janeiro; minha participação na apresentação do Jornal da TV Record, em SP – que era a Globo da época – e da voz fantástica da cantora Jacy Amorim... E, muita, mas muita mesmo, verdades e conquistas do Rádio cuiabano.
De vez em quando, surgem professores de Deus que atentam contra a segurança nacional afirmando que: “quando aqui cheguei, fez-se a luz”, pois “o Rádio daqui não ficava no ar à noite”... É só uma das grandes e sofisticadas fantasias de extraterrestres nesta minha mágica Cuiabá.
* PAULO ZAVIASKY é jornalista
Comentários