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Cultura
Sexta - 27 de Junho de 2014 às 16:25
Por: *JOSÉ ANTONIO LEMOS DOS SANTOS

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Foto: Divulgação/Klein Sun Gallery, NovaYork

Num dos trabalhos da série “Tools of study”, o busto de Michelangelo surge maleável como um dançarino de break -

Num dos trabalhos da série “Tools of study”, o busto de Michelangelo surge maleável como um dançarino de break -

Há um dito popular na China: “A vida é frágil que nem papel”. Curioso é quando o papel ganha a aparência de algo rígido, que não rasga, não quebra. É essa a impressão, ou a confusão, que se tem diante das esculturas do artista Li Hongbo, que nasceu em 1974 na pequena província Ji Lin e mora hoje em Pequim.

Quando criança, ele era obcecado pelos ornamentos chineses, modelados com papel colado, no formato hexagonal, casa de abelha. Ao longo dos anos, não abandonou o interesse pelo material: passou a fazer seus próprios brinquedos com papel, se dedicou à pintura, mais tarde se formou designer gráfico, trabalhou como editor. Durante todo o tempo, colecionou uma enorme quantidade e variedade de papel e criou uma técnica surpreendente de fazer esculturas, aprimorada durante 12 anos.

— Eu gostava de usar papel para fazer brinquedos, e às vezes até comprava brinquedos de papel, já que o preço era muito acessível. Isso imbuiu minha infância de uma felicidade ilimitada — explica Li Hongbo, em entrevista por e-mail. — Em 2006, fui estudar na Central Academy of Fine Arts. Nesse período, me lembrei dos brinquedos de papel da minha infância, e esse material se tornou a base do meu trabalho. Por seu preço baixo, abundância, plasticidade e por ser fácil de encontrar, usei papel, mais uma vez, para fazer meus “brinquedos gigantes”, isso é, minhas criações artísticas.

Moldadas com serrote elétrico, as esculturas não passam de papel — 30 mil folhas, em alguns casos — e cola. Nada mais. Para o acabamento, o artista usa uma ferramenta chamada rebarbadora (também conhecida como retificadora) e lixa. Antes de serem manipuladas, estendidas como sanfonas, as esculturas de Hongbo parecem feitas de um material concreto, imutável: porcelana, cerâmica, madeira.

No vídeo “Statues in motion”, a impressão que se tem é que as esculturas são modificadas com efeitos especiais. A flexibilidade, a força e a resistência permitem que os tais “brinquedos gigantes” sejam esticados e ganhem um aspecto completamente novo — mas que voltem, iguaizinhos, à forma original.

— Quando comecei a estudar pintura com seriedade, gostava de trabalhar com modelos de gesso. Ao longo da escola e da universidade, continuei fazendo esses esboços. Eles ficavam lá sem se mexer, e eu podia manipulá-los como bem quisesse. Às vezes, eu os pintava lindamente. Outras, eles pareciam medonhos, e até quebrados, mas o fato é que nunca reclamavam. Até hoje são meus amigos mais leais.

A interação do público com as obras é parte fundamental para entender o processo elaborado por Hongbo. Isso ficou claro em março, na galeria de arte contemporânea chinesa Klein Sun, em Nova York, onde ele apresentou “Tools of study”. São reproduções em papel de bustos clássicos, figuras recorrentes na educação formal dos estudantes de arte, como o “David” de Michelangelo.

— Esses modelos estáticos do meu passado não tinham emoção, eram imutáveis. Ainda assim, com cola, corte e acabamento no papel, fiz as esculturas, que têm a mesma aparência, perfil e até a mesma cor que meus modelos de gesso. No entanto, mudanças essenciais aconteceram e eles não são mais meros modelos de gesso estáticos. Podem ser esticados, revertidos e transformados nas mãos de pessoas. O estado estático mudou, junto com minha memória. Aqueles modelos voltaram, como meus amigos, mesmo que tantos anos tenham se passado.





Fonte: O Globo

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